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terça-feira, 31 de janeiro de 2017

A colonização do pensamento evidencia a subalternidade

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Fátima Oliveira
Médica – fatima.oliveira1953@gmail.com @oliveirafatima_


Alguns episódios da política nacional impeliram-me a pensar mais sobre a colonização intelectual. E o faço a partir do dito por Karl Marx e Friedrich Engels em “A Ideologia Alemã” (1847): “Os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, os pensamentos dominantes, ou seja, a classe que tem o poder material dominante numa sociedade é também a potência dominante espiritual”.


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Não sou especialista no tema “colonização das ideias”. Utilizarei “colonização” no sentido de “a ação e o efeito de colonizar – se fixar num território que não o de origem dos colonizadores”. Consta na Enciclopédia das Línguas no Brasil que “os efeitos ideológicos de um processo colonizador materializam-se em consonância com um processo de colonização linguística, que supõe a imposição de ideias linguísticas vigentes na metrópole e um ideário colonizador enlaçando língua e nação em um projeto único...”.


Resultado de imagem para Lula com câncer  Voltando aos episódios que mexeram comigo e fizeram aflorar a necessidade de entender mais de colonização do pensamento (além dos inúmeros cerceamentos do direito de ir e vir de políticos de esquerda em restaurantes): o primeiro, a doença de Lula, em 2011. Adversários políticos, com o intuito de desmoralizar e vulnerabilizar, criticaram, com má-fé, o direito de Lula escolher como e onde queria tratar sua doença, segundo suas posses. O que ocorreu (“Lula, vá se tratar no SUS”) é uma anomalia numa democracia porque foi baseado num ideário fascista!


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            “Só o preconceito de classe, uma das expressões da luta de classes, contra um sertanejo nordestino originariamente pobre e retirante, que, pelo voto popular, presidiu o Brasil por duas vezes e ainda elegeu sua sucessora, explica que gente que se diz ‘bem-nascida’ e que, mesmo quando come sardinha, diz que arrota caviar, exija que Lula vá se tratar no SUS quando essa não foi a escolha que ele fez! Acessar o SUS é um direito, e não uma obrigação!” (“São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e aimagem”, O TEMPO, 8.11.2011).


  O segundo, “a profanação do velório de José Eduardo Dutra, ex-presidente do Partido dos Trabalhadores e da Petrobras – que não aparece em nenhuma denúncia da empresa! O que torna mais espantosa a chamada do panfleto, jogado na porta do velório: “Petista bom é petista morto!” São dois delitos graves: profanação praticada contra um morto e usurpação do direito que tem a família de velar em paz seu morto! Em que mundo vivemos em que não podemos sequer velar nossos mortos? Até animais velam seus mortos! (“A profanação de rituais fúnebres é imoral e criminosa”, O TEMPO, 13.10.2015).


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O terceiro, em curso. A mulher de Lula, Marisa Letícia, internada desde 24 de janeiro, após Acidente Vascular Cerebral (AVC) hemorrágico decorrente de rompimento de um aneurisma. Além das paneleiras em vigília diante do Hospital Sírio-Libanês e da verbalização de desejos de morte para ela, a postagem do “conde” Chiquinho Scarpa no Facebook, prenhe de mentiras, é fiel ao que um fascista pensa, mesmo não desejando a morte dela.


A imagem pode conter: 1 pessoa, texto  (Ilustração na matéria de Chiquinho Scarpa no Facebook)




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Resultado de imagem para posse de lula 2003  (Posse de Lula em 2003 e em 2007)
PUBLICADO EM 31.01.17
Resultado de imagem para lula e marisa leticia FONTE: OTEMPO 

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

O peso do patriarcado nosso de cada dia, dia após dia...

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Fátima Oliveira
Médica – fatima.oliveira1953@gmail.com @oliveirafatima_ 


Em tempos de papa “morde e assopra” – sataniza a teoria de gênero e exorta aos homens que ouçam as mulheres – e da misoginia de Donald Trump entronizada na Casa Branca, dá arrepio pensar. Eu vivi os tempos Bush, pai e filho, e Regan. Sei do que falo e do que temo. É quase um desalento.

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No horizonte, uma disputa ideológica titânica pertinente às questões de saúde pública – o primeiro ato de Trump foi contra o Obamacare (2010), que garantiu seguro de saúde para milhões de americanos. Trump, em ordem executiva, reduziu a “carga financeira” e regulatória do sistema antes de derrogar a lei e substituí-la.
Trump desferirá ataque brutal aos direitos sexuais e aos direitos reprodutivos. De certeza contará com o apoio irrestrito da Santa Sé e do Vaticano! A conjuntura é de somatória de fundamentalismos, lançando tentáculos de modo danoso e singular sobre quem vivencia situações de vulnerabilidade, a exemplo das opressões de gênero, racial/étnica e de classe. Do site da Casa Branca foram eliminadas as páginas sobre direitos LGBT e civis e mudanças climáticas.


Resultado de imagem para ReagaN, bUSH E tRUMP  (Regan, Bush e Trump)
Resultado de imagem para tea party movement   Pontuo que ele tem o compromisso com o movimento Tea Party – ultraconservador e ultradireitista, um braço do Partido Republicano – de restabelecer, via ação executiva, a lei ou regra da mordaça, ou Regra da Obstrução Global, conhecida como Global Gag Rule, criada por Ronald Regan (1981-1989). Foi rechaçada por Bill Clinton (1993-2000) e restaurada por Bush Filho (2001-2008). Conforme a Global Gag Rule, as organizações estrangeiras que recebem fundos norte-americanos, públicos ou privados, para planejamento familiar, saúde sexual e saúde reprodutiva estão proibidas de falar sobre aborto.
No primeiro dia do governo de George W. Bush, o primeiro ato foi legislar sobre os corpos das mulheres do mundo inteiro, reeditando, como uma religião a ser seguida, a maldita Global Gag Rule e, ao mesmo tempo, estimulando, com muito apoio financeiro, a abstinência sexual – promessa de se manter virgem até o dia do casamento. Todos os governos do mundo disseram “amém”.
Pesquisas do governo norte-americano sobre a cruzada pela preservação da virgindade – levada a cabo por grupos cristãos e por George W. Bush – concluíram que não foi reduzido o contágio de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs), pois a maioria dos adolescentes que se comprometeram a abster-se sexualmente antes do casamento mandou o compromisso às favas. Registrou-se taxa igual de transmissão de DSTs dos demais pesquisados: 12 mil adolescentes, entre 12 e 18 anos, foram acompanhados por oito anos, dos quais 88% dos que prometeram castidade tiveram relações sexuais antes do casamento.


Resultado de imagem para Peter Bearman  Conforme Peter Bearman, sociólogo da Universidade de Columbia e condutor da pesquisa mesmo entre quem manteve o compromisso de abstinência ou prorrogou a idade de sua primeira experiência, poucos usavam métodos anticoncepcionais, correndo, por isso, o mesmo risco de contágio por DSTs ou de gravidez! Para ele, “o movimento a favor de uma educação sexual baseada na abstinência induz não apostar em campanhas de informação sobre o sexo seguro, o que se torna contraproducente”.


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 (enfermeira brasileira Myriam Marques, de turbante laranja)


O patriarcado prospera sob o manto do fundamentalismo e estimula visões de mundo puritanas e teocráticas. O papel das mulheres é se insurgir contra as trevas! (como expliquei em “A cruzada do papa Francisco de satanização da teoria de gênero”, de 25.10.2016). As norte-americanas, com apoio do feminismo mundial, sabem que consolidar o Estado laico é a exata contraposição ao fundamentalismo religioso, portanto marcharam contra o fortalecimento das ideias patriarcais.


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PUBLICADO EM 24.01.17
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Resultado de imagem para Marcha das mulheres contra trump FONTE: OTEMPO

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

A prática da Medicina Defensiva não beneficia a ninguém

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Fátima Oliveira
Médica – fatima.oliveira1953@gmail.com @oliveirafatima_ 


Gosto de trabalhar em urgência. Por uma questão de ter paz de consciência, de poder dormir por ter feito tudo o que sabia e a medicina disponibilizava para as pessoas que atendi.
Em pronto-socorro aprendi muito sobre o ser humano, profissionais da medicina e clientela. Há coisas para rir, chorar e refletir. Sempre que vejo/ouço notícias sobre inaugurações de hospitais, a primeira imagem que aparece são os quilômetros de exames complementares desnecessários, um escoadouro ininterrupto de dinheiro que anemia o serviço público, mas que cada dia se firma mais como o poder número 1 da prática da medicina defensiva, sequestrando dinheiro precioso que poderia ser empregado em outras ações.


Resultado de imagem para José Guilherme Minossi e Alcino Lázaro da Silva José Guilherme Minossi Conforme José Guilherme Minossi e Alcino Lázaro da Silva, “a medicina defensiva surgiu na década de 1990 nos Estados Unidos, numa tentativa de fazer frente às crescentes demandas legais dos pacientes. Pode ser definida como uma prática médica que prioriza condutas e estratégias diagnósticas e/ou terapêuticas e que tem como objetivo evitar demandas nos tribunais... Na prática, se caracteriza pela utilização exagerada de exames complementares, uso de procedimentos terapêuticos supostamente mais seguros, encaminhamento frequente de pacientes a outros especialistas e a recusa ao atendimento de pacientes graves e com maior potencial de complicações” (“MedicinaDefensiva: Uma Prática Necessária?”).


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Resultado de imagem para consulta médica  Os quilômetros de exames solicitados que nada têm a ver com a queixa só dizem uma coisa: “Pouca medicina”! E “pouca medicina” significa que a pessoa doente não foi devidamente examinada, pois até hoje, sob o concurso da medicina tecnologizada, a clínica ainda é soberana! E exames complementares bem solicitados, segundo a queixa e o exame clínico de quem o médico consulta, recebem o justo nome de “exames complementares” porque de fato são complementares apenas da história ouvida e do exame clínico realizado! Não mudou, continua assim!


Resultado de imagem para medicina defensiva Há algo errado e irresponsável quando, após 12 horas de plantão, 90% ou mais das telerradiografias de tórax solicitadas, num rol de 50, são normais! Acontece! Verifiquei várias vezes: “Ave, Maria, no plantão da Fátima nem radiografia de tórax a gente pode pedir sossegado”, ouvi de um colega campeão de raios X normais! Na lata: “Tudo o que temos do exame de urina, hemograma, endoscopia, tomografia a ressonância magnética é para quem deles precisa, e não para suprir a falta de exame clínico e a incapacidade de montar uma hipótese diagnóstica”.
Quando ainda “atendia à porta”, a pessoa doente mal sentou e disse: “Doutora, a senhora atende a gente muito bem, mas pede pouco exame. Hoje quero fazer todos os exames!” Fiz de conta que não ouvi. Era uma portadora de angina estável conhecida do serviço. Indaguei por que ela veio ao pronto-socorro. Ouvi com atenção, examinei e encaminhei à sala de medicação com os pedidos dos exames do nosso protocolo. Ela verificou os pedidos e disse: “Eu não fico boa aqui nas ‘clínicas’ porque só pedem esses examezinhos bobos”.
Contra a medicina defensiva – que, “além de ineficiente em proteger o médico, traz consequências graves ao paciente e à sociedade, já que gera um custo adicional incalculável ao exercício da medicina, determina um maior sofrimento ao doente e faz com que haja uma deterioração na relação médico-paciente” –, temos de reafirmar os referenciais básicos da eticidade dos serviços de saúde, compreendendo o dito pelo bioeticista Daniel Callahan: “Se, para algumas pessoas, uma aspirina resolve suas doenças, outras necessitam de transplantes de órgãos”.


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Resultado de imagem para consulta médica FONTE: OTEMPO

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

A banalização da vida diante da cultura do abandono e da morte

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Fátima Oliveira
Médica – fatima.oliveira1953@gmail.com @oliveirafatima_ 


O ano de 2017 expondo as vísceras da cultura do abandono e da morte. E não sensibiliza! Os crimes misóginos que estão chamando de “chacina do revéillon” em Campinas (SP) são feminicídios, pois o motivo basilar do assassino Sidnei Ramis de Araújo, 46, técnico do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais, foi o ódio à ex-mulher Isamara Filier, 41 anos, técnica em contabilidade, que registrou seis BOs contra ele.
O Estado “alisou a cabeça” dele! O assassino foi acusado pela mãe de violência sexual contra o filho, o que a polícia não comprovou. Resultado? Foram mortas 12 pessoas pelo ex-marido de Isamara Filier, inclusive o filho dele, de 8 anos. Foram assassinadas nove mulheres e três homens, incluindo a criança! Total de 13 mortes, pois o assassino se suicidou em seguida. Todavia, deixou uma carta na qual revelava quem era: “Tenho raiva das vadias que se proliferam e muito a cada dia se beneficiando da lei vadia da penha!”


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Chacina


Em Manaus, no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, nos dias 1º e 2 passados, ocorreram 56 mortes e 112 fugas; e quatro mortes na Unidade Prisional do Puraquequara. Na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, em Roraima, na madrugada de 6 de janeiro, cerca de 33 presos foram mortos, a maioria decapitada! O governo brasileiro considera “acidentes” as duas chacinas.


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Declarações de vários integrantes do governo federal chocam pelo “caralimpismo”, mas a mais grave é a desfaçatez de Bruno Moreira Santos, vulgo Bruno Júlio, presidente nacional da Juventude do PMDB, até então secretário da Juventude de Temer: “Eu sou meio coxinha sobre isso. Sou filho de polícia, né? Tinha era que matar mais. Tinha que fazer uma chacina por semana”. Segundo várias publicações, ele responde a inquéritos sobre lesão corporal contra a ex-mulher e assédio sexual a uma ex-funcionária. Como, com tal “folha corrida”, chegou ao cargo?
Bruno Júlio é filho do Cabo Júlio, de Minas Gerais – líder da greve da PMMG em 1997 (governo Eduardo Azeredo); deputado federal eleito em 1998, reeleito em 2002, acusado de integrar o escândalo dos sanguessugas; vereador em Belo Horizonte de 2009 a 2012. Atualmente, é deputado estadual. Bruno Júlio pediu demissão em 7.1.2016.


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Resultado de imagem para Flávia Piovesan e as mortes de manaus  A secretária de Direitos Humanos Flávia Piovesan, que por anos foi musa dos direitos humanos no Brasil, mas jogou sua história de vida nas calendas gregas para compor o governo Temer, disse que “o Estado tem odever de assegurar a integridade física, psíquica e moral dos presos, que sótêm cerceada a liberdade, mas permanecem com o direito de terem suas vidasresguardadas. O que ocorreu em Manaus foi um desperdício evitável de vidashumanas... Houve omissão, além de uma política pública desacertada,insuficiente e ineficaz para prevenir”. O chefe dela, o ministro da Justiça e Cidadania, Alexandre de Moraes, pensa diferente. Porém, presos estão sob guarda do Estado.


O bebê nasceu na casa, de parto normal, com o auxílio da avó


Aconteceu em Piracicaba (SP), no dia 5 passado: “Mãe de bebê achado em mala tem 11 anos e era estuprada pelo pai, diz polícia”; o pai da menina, de 36 anos, “é suspeito de ter engravidado a filha menor de idade”; e a mãe dela disse que fez o parto e seu marido “descartou o bebê em frente a uma chácara do bairro Itaperu por volta das 20h”. Não consigo imaginar uma menina de 11 anos grávida do pai, a mãe fazendo o parto, e o pai descartando o bebê, como se fosse um animal! Mas aconteceu. É animalidade ilimitada.
A naturalização da banalização de vidas concretas deu a tônica à chegada de 2017 no Brasil, lamentavelmente. Viramos um país de desvalidos.


PUBLICADO EM 10.01.17
    FONTE: OTEMPO