(DUKE)
Fátima Oliveira
Médica - fatimaoliveira@ig.com.br @oliveirafatima_
Busco arrego em Guimarães Rosa: “O mundo é mágico. As
pessoas não morrem, ficam encantadas”. Papete (José de Ribamar Viana) virou
encantado em 26.6.2016. “Mamãe eu tô com uma vontade louca/ De ver o dia sair
pela boca/ De ver Maria cair da janela/ De ver maresia /Ai maresia... Bandeira
de aço/ Bandeira de aço...” (César Teixeira).
Papete foi meu conforto mental naquilo que a filosofia
rosiana diz que “viver é um rasgar-se e remendar-se”. Papete foi um ombro amigo
de travessia. E travessia é travessia, pois “o real não está na saída nem na
chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia” (Guimarães Rosa).
Fora do Maranhão por quase 30 anos, tive a companhia
fiel de Papete e ninei filharada e netaiada com seu disco “Bandeira de Aço”
(1978), bem cultural imaterial do Maranhão – que, para Flávio Paiva, “é um
trabalho essencialmente inoxidável, em seu caráter anímico, zoomórfico e
arquetípico, de sotaque de orquestra, matraca, zabumba e viola... Parte da
trilha sonora do Brasil profundo” (“Bandeira de Aço”, 2013).
Aqui, em casa, as músicas de “Bandeira de Aço” são
acalantos! Sabemos acompanhar “Boi da Lua”: “Meu são João.../ são João, meu são
João/ Eu vim pagar a promessa/ De trazer esse boizinho/ Para alegrar sua festa/
Olhos de papel de seda/ Com uma estrela na testa... Chora, chora/ Chora boi da
lua vem pedir uma esmola/ Pra aquela boneca de anil/ Mamãe eu vi boi da lua/
Dançar no planeta do Brasil” (César Teixeira).
(Boi da Lua)
“Engenho de Flores” alumbra: “Ê alumiô, toda terra e mar/ Ê alumiô, toda terra e mar/ Eu vi fortaleza abalar/ Eu vi fortaleza abalar/ Agora qu’eu quero ver/ se couro de gente é pra queimar (bis)/ Vou pedir pra são João/ Cosme e Damião/ Pra nos ajudar...” (Josias Sobrinho).
(Boi da Lua)
“Engenho de Flores” alumbra: “Ê alumiô, toda terra e mar/ Ê alumiô, toda terra e mar/ Eu vi fortaleza abalar/ Eu vi fortaleza abalar/ Agora qu’eu quero ver/ se couro de gente é pra queimar (bis)/ Vou pedir pra são João/ Cosme e Damião/ Pra nos ajudar...” (Josias Sobrinho).
(Papete, por DUKE, O TEMPO, 24.6.2014)
Clarinha, que teve a honra de ver e ouvir Papete no palco, diz toda faceira: “É boooi! De boi eu gosto, num é, vovó?” É boiera! Luana e Lucas, cariocas: “Vó, bota aí as músicas do Maranhão”. E Inacim, o neto gaúcho, grita: “É lua”! Repito: “Papete, a expressão do sagrado do são João maranhense” (O TEMPO, 24.6.2014).
(Papete e sua mulher Gisele Paiva)
Papete não é um ilhéu da gema. Nasceu na beira do rio
Mearim, em Bacabal (MA), em 8.11.1947. A cosmovisão ilhéu ludovicense impregnou
seu jeito de ser e fazer profissional de cantor, compositor e
multi-instrumentista: um dos cinco melhores percussionistas do mundo e a
maestria inimitável com o berimbau.
Papete declarou: “O são João, para mim, é uma parceriacom a minha parte espiritual. Isso, para mim, é um compromisso religioso com aminha infância, de resgate do meu passado, e um encontro com tudo aquilo que acredito.Eu amo a cultura maranhense” (2011).
Com seus dons musicais e suas esmeradas técnicas, Papete tinha estofo para brilhante carreira apartado da produção musical maranhense, porém o senso tolstoiano, já aflorado em “Bandeira de Aço”, bradou: “Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia” (Leon Tolstói, 1828-1910).
Com seus dons musicais e suas esmeradas técnicas, Papete tinha estofo para brilhante carreira apartado da produção musical maranhense, porém o senso tolstoiano, já aflorado em “Bandeira de Aço”, bradou: “Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia” (Leon Tolstói, 1828-1910).
Tolstoiano, desde 1990, Papete, com sua banda, se
dedicou a interpretar músicas do Maranhão, a pesquisar e a divulgar
compositores maranhenses, a exemplo do livro “Os Senhores Cantadores: Amos e
Poetas do Bumba Meu Boi do Maranhão” (Editora Ipsis, 2015), cuja inspiração foi
a solidariedade: “Ao perceber que Coxinho, um dos maiores ícones do bumba meu
boi maranhense, morreu pobre e sem receber as honrarias devidas, pensei que
devia fazer algo para preservar a memória daqueles que muito fizeram pelo nosso
bumba meu boi, e daí veio a ideia para esse projeto”.
Papete é o Maranhão por inteiro, benzido e encruzado:
olhos de papel de seda com uma estrela na testa.
FONTE: OTEMPO
Discografia de Papete: Berimbau e percussão (1975), Bandeira de Aço (1978), Água de Coco (1979), Planador (1982), Papete (1987), Rompendo fogo (1989), Bela Mocidade (1991), Voz dos arvoredos (1992), Laço de Fita (1994), Música Popular Maranhense (1995), Papete (1996), O melhor de Papete (1997), Tambô (1999), Era uma vez… (2004), Jambo (2006), Aprendiz de cantador (2008), Estrada da Vitória (2010) e Senhor José (2013).
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