(DUKE)
Fátima
Oliveira
Médica
- fatimaoliveira@ig.com.br @oliveirafatima_
Ler é um dos maiores prazeres de minha vida. Devo
parte substancial do que sou aos livros que li, tanto científicos quanto
literários. Estou sempre com livros na mesinha de cabeceira (não durmo sem ler
algo!), no carro, na bolsa...
Relembrando o que já fiz para ler – “desde ‘botar’
marido pra dormir, esperar o danado cair nos braços de Morfeu, ligar o abajur e
abrir o livro... ai que ‘trepeça’ boa!.. –, não imagino um mundo sem livros de
papel. E os prazeres inenarráveis de abrir, folhear e ler um livro? De marcar
onde parou, fechá-lo e a fissura de retomar a leitura?” (“Ler é bater pernaspelo mundo com as endorfinas nas alturas”, O TEMPO, 1º.11.2012).
Em “Lembranças de uma cozinha e da primeira galinhacheia” (2.12.2008), revelei um pouco de minhas vivências de menina sertaneja
que bateu asas e voou, ultrapassando as fronteiras do sertão, e que percorreu o
mundo duas vezes, carregando-o no peito. A primeira, por meio da leitura. Ler é
bater pernas pelo mundo... A segunda, presencialmente. É muito para quem não
nasceu em berço de ouro e não é caixeira-viajante. Eu sei. Mas a medicina
legou-me asas (“Ainda saudosa da cozinha no sertão, apesar da trabalheira”, O
TEMPO, 9.12.2008).
(Lucas e Luana, comandando Cavalgada, Haras Bella Vista, dezembro 2008)
Na semana passada, recomendei “O Futuro Roubado”, de
Theo Colborn, Dianne Dumanoski e John Peterson Myers (L&PM Editores, 1997),
numa crônica que escrevi pensando em minhas netas Luana e Maria Clara e nos
netos Lucas e Inácio, pois já estou quase na prorrogação de minha expectativa
de futuro, mas a “netaiada” tem futuro pela frente.
(DUKE)
E registrei: “O título ‘O Futuro Roubado’ hoje é mais
que um livro. É também um conceito político de resistência aplicável a
conjunturas políticas que retiram, usurpam, entravam direitos e roubam a
cidadania, tornando perenes as assimetrias econômicas, as exclusões e as
vulnerabilidades sociais e políticas” (“‘O Futuro Roubado’ é um livrocientífico que dói na cidadania”, O TEMPO, 10.5.2016).
(Paulo Tedesco)
Parênteses para dizer que fiquei impactada com o
artigo de Paulo Tedesco “O golpe no mundo do livro”, no qual diz que, “em tempo
de golpe político, é bom repensar o mundo do livro e dos autores e sua
trajetória em períodos repressivos” ; e reaviva nossa memória com alguns
autores clássicos que passaram por situações complicadas diante de momentos
políticos: Dostoiéwski, Antonio Gramsci, Graciliano Ramos, Federico Garcia
Lorca... (Vermelho, 9.5.2016).
Clarinha, minha neta, mal deitamos, pega um livro e os
meus óculos de leitura dizendo: “Vamos ler, num é, vovó?”. Agora que ela está
lendo, ainda titubeante, travamos uma peleja para ver quem vai ler. Outro dia
ela “me pegou de jeito”.
Nas mãos, meu livro “Então, Deixa Chover”, cuja capa
ela venera – uma mulher montada num cavalo com suas duas filhas e o filho –,
indagou como eu o escrevi. Conversa vai, conversa vem, pediu-me que eu contasse
a história sem ler o livro!
– Mas, Clarinha...
– Escreveu, não escreveu? Como não sabe contar sem
olhar no livro?
Que jeito, né? Falei, falei... “Agora, vó, lê no
livro!”. Já cansada, li um trechinho... Cochilava quando, como num sonho, ela retirou
cuidadosamente meus óculos, o livro de minhas mãos, verificou meus lençóis,
beijou meu rosto num sorrisinho matreiro, se achegou, e dormimos
abraçadinhas...
Pela manhã, ainda na cama, disse-me: “Ih, vovó, estou
preocupada. Fica lendo, lendo e dorme. Pode quebrar os óculos! Toma cuidado,
vó! Depois, como vai escrever no computador as histórias tão bonitas que tua
cabeça inventa?”. E rimos. Ô delícia...
Eis um futuro que não podemos permitir que seja
roubado!
PUBLICADO EM 17.05.16
FONTE: OTEMPO
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