Visualizações de página do mês passado

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Microcefalia: a República cala e permite a imolação das grávidas

01  (DUKE)
Fátima Oliveira
Médica - fatimaoliveira@ig.com.br @oliveirafatima_


Como esperado, já que as interdições ao aborto nunca impediram a sua realização, parece que só mulheres pobres estão tendo bebês com microcefalia. Quem pode pagar R$ 5.000 pratica desobediência civil e aborta entre o pecado e o crime. O Brasil possui uma das leis sobre aborto mais restritivas do mundo, com três permissivos legais: gravidez pós-estupro, em caso de risco de vida da gestante (1940) e anencefalia (2004).
Em “Repressão policial, ideológica e política contra o aborto no Brasil”, registrei: “O aborto – expressão radical de resistência – é uma experiência milenar de milhões de mulheres, que expõe dilemas morais e visibiliza que não é ético obrigar a mulher a levar adiante uma gravidez quando ela não quer ou não pode” (O TEMPO, 14.9.2004).




Numa epidemia que não sabemos quanto vai durar, empurrar milhares de mulheres para o aborto clandestino e inseguro é inominável! É o que a República está fazendo: reforçando o caráter de classe na criminalização do aborto, pois só penaliza as pobres, em geral negras, que sem dinheiro recorrem aos piores lugares, colocando em risco a saúde e até a vida.




Está em vigor uma tabela nacional para aborto/microcefalia: aplicação de cloreto de potássio em clínica privada: R$ 2.000 + R$ 3.000 pelo aborto em si. Há uma segunda opção: pagar a aplicação do cloreto de potássio em serviço privado e realizar o aborto no SUS. E há o Cytotec, ainda nas mãos do narcotráfico no Brasil.
Lugar de ministro da Saúde torcedor é em casa, presidenta Dilma, sobretudo quando não sabe o que é idade fértil ou reprodutiva, coisa bastante diferente de “período fértil”, que dura em média seis dias e corresponde ao período da ovulação! Melhor ser gado pé-duro no Piauí, que é patrimônio histórico e cultural desde 2009!


 (Gado pé-duro)


Em 1940, a República Federativa do Brasil não se olvidou e incluiu a permissão de aborto em caso de gravidez resultante de estupro, inspirada em uma tendência ética internacional do pós-Primeira Guerra Mundial (1914-1919), quando o estupro adquiriu dimensão pública de arma de guerra: os invasores e/ou vencedores selavam a vitória estuprando as mulheres dos vencidos. Por que, no cenário da epidemia de microcefalia, não toma para si a responsabilidade de inclusão de mais um permissivo legal? São cenários similares!


12   (DUKE) OPINIAO15-12-15-  (DUKE)



“O Brasil deve assumir integralmente as crianças com microcefalia e suas mães” (“O que faremos com nossas crianças com microcefalia?”, O TEMPO, 1º.12.2015). “Quedo-me à impotência diante dos números. Os casos suspeitos só aumentam. Nem sequer temos a dimensão, nem como estimá-la, do que nos espera” (“Desafios ambientais, médicos e psicossociais emicrocefalia”, O TEMPO, 15.12.2015). É dever do Estado: cuidar com dignidade das crianças com microcefalia; apoiar gestantes e mães resilientes diante da microcefalia e aquelas que não desejam levar a gravidez adiante.
Defendo o direito ao aborto voluntário segundo a decisão da mulher e considero imoral o Estado impor à mulher ter um filho quando ela não quer.

 PUBLICADO EM 19.01.16
 FONTE: OTEMPO

Nenhum comentário:

Postar um comentário