Visualizações de página do mês passado

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Escolas unidocentes e turmas multisseriadas em escolas urbanas


ELAS SÃO UMA DAS MAIORES INOVAÇÕES NO ENSINO NO MUNDO
Fátima Oliveira
Médica – fatimaoliveira@ig.com.br @oliveirafatima_


Ao ler a reportagem de Raphael Ramos "Estado coloca alunos de séries diferentes na mesma turma" (O TEMPO, 3.4.2012), peguei a minha beca de normalista (sim, formada em 1971!) para descobrir o que tem a ver o professor Anastasia, governador de Minas Gerais, com a socióloga Vicky Colbert, ex-vice-ministra da Educação da Colômbia, especialista em educação rural, criadora da Fundação Escuela Nueva (1987) e inspiradora do Programa Escola Ativa (1997), da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação (Secad/MEC).


(Vicky Colbert)

Reavivei na memória que, até sair de casa para estudar em Colinas (MA), só conhecia escolas unidocentes! Talvez por ser a escola unidocente a realidade tão natural do meio em que vivi, até pensar em escrever sobre o tema ela não era uma memória viva e consciente. Jamais estabeleci diferenças entre as escolas que frequentei, pois culturalmente uma escola é um farol do saber e qualquer uma é sempre melhor do que nenhuma!
Aprendi a ler com o professor Izídio, na escolinha dele. Era começo da década de 1960 quando fui para a Escola Rural Humberto de Campos, única escola pública de Graça Aranha (MA), onde lecionavam duas professoras: uma "professora rural" (havia um curso que habilitava para tanto, equivalente ao antigo ginásio); e uma professora leiga (tinha um "estudinho", mas bastava ter o curso primário!).
Resumindo a ópera: a dona Maria do Carmo, professora rural "formada", ficava com a turma dos 2º, 3º e 4º anos; e a galega dona Zilma, com quem não sabia ler nem escrever - os da carta de ABC, da cartilha e os desarnados do 1º ano! Por três anos e meio, eu fui aluna de dona Maria do Carmo! Em Colinas, segundo semestre do 4º ano, foi uma diferença brutal estudar numa sala só com alunos da mesma série - e em dose dupla, porque pela manhã eu estudava no Grupo Escolar João Pessoa e à tarde frequentava o exame de admissão ao ginásio! Pulo. Passei em ambos... Aos 24 anos, estava formada em medicina...



É dificílimo entender essa “zueira” toda
contra essas turmas, uma nova proposta do
governo mineiro e, sobretudo,
a rasteirice dos contra-argumentos


Para mim é dificílimo entender essa "zueira" toda contra "turmas unidocentes" ou "turmas unificadas" ou "turmas multisseriadas" (para as turmas de 1º ao 9º ano do ensino fundamental), uma nova proposta do governo mineiro e, sobretudo, a rasteirice dos argumentos contrários, que enfocam apenas que o governo quer reduzir custos. Pode ser, mas será só isso? Por que não nos debruçarmos holisticamente na análise?
Sei que "turma unidocente/unificada/multisseriada" é uma coisa e "escola unidocente" é outra! Em não sendo especialista em educação, a minha visão tem muitos limites e tem a ver unicamente com a minha história de vida, que não pode ser a régua de nada, apenas o resultado do sucesso de uma escolinha unidocente furreca, mas que moralmente me credencia a, de cara, não condenar a decisão do governo de Minas.
Até onde conheço, a escola unidocente é um conceito e uma prática tradicionalmente aplicável a meios rurais. Todavia, não vejo como o fim do mundo que possa ser extensiva a meios urbanos ("turma unificada") em determinadas circunstâncias, sem que tal postura seja em prejuízo dos alunos e rasteira no professorado, além do que a rigor o MEC não proíbe.





 Os inúmeros prêmios que Vicky Colbert tem recebido e a aplicabilidade promissora de sua proposta a escolas urbanas da Colômbia, além do que as "escolas de dona Vicky" são tidas como uma das três maiores inovações no ensino no mundo, sugerem, no mínimo, cautela na análise de turmas multisseriadas.


Publicado no Jornal OTEMPO em 15.05.2012


(A escola da aldeia, em 1848, Albert Anker)

LEIA TAMBÉM: Claudio de Moura Castro: As escolas de dona Vicky

"Praticamente sem aumentar os custos, dona Vicky conseguiu que estudantes do interior obtivessem desempenho melhor em testes do que os citadinos"

7 comentários:

  1. Dra. Fátima, gostei dos argumentos, mas eles não me ceonvenceram sobre a seriedade do governo de Minas sobre o assunto

    ResponderExcluir
  2. Uma crônica de muita beleza e com argumentos que nos ajudam a pensar. Mas ainda tenho dúvidas sobre a decisão do governo mineiro.

    ResponderExcluir
  3. Dra. Fátima, não hpa termos de comparação entre escola unidocente e turmas multisseriadas em meios urbanos. Acho que o governador de Minas Gerais, o Sr. Prof. Dr. Anasatasi está enganado.
    No mais, sua crônica é também muito bonita

    ResponderExcluir
  4. Fátima o teu artigo me levou a ler e para minha surpresa as escolas unidocentes e turmas multisseriadas não são parte do ontem, mas do hoje e respondem por 18% de todas as matrículas escolares no Brasl e ficam localizadas na zona rural. É espantoso que as pessoas ditas da cidade não saibam disso!
    Também é espantoso que muitas dessas escolinhas de roça estejam sendo fechadas, de um tanto que a presidenta Dilma resolveu dar um basta:

    Dilma quer impedir fim de escolas rurais


    Conforme o Ministério da Educação, nos últimos cinco anos foram fechadas 13.691 escolas no campo





    A presidente Dilma Rousseff enviou ontem ao Congresso projeto de lei que pretende impedir o fechamento de escolas na área rural. Conforme o Ministério da Educação, nos últimos cinco anos foram fechadas 13.691 escolas no campo. Ao deixar o lançamento do Programa Nacional de Educação do Campo (Pronacampo), o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, afirmou que o fechamento está ligado à política de prefeituras para reduzir custos.

    De acordo com o projeto, o fechamento terá de ser debatido nos conselhos municipais de Educação, com a participação da sociedade civil.

    Pronacampo- O programa pretende garantir acesso de 1,9 milhão de estudantes a bibliotecas, implantar ensino integral em mais de 10 mil escolas, promover formação continuada para mais de 10 mil professores, oferecer 120 mil bolsas de formação profissional e disponibilizar recursos para a construção de 3 mil escolas e aquisição de 8 mil ônibus escolares.

    Zero Hora
    http://www.wscom.com.br/noticia/educacao/DILMA+QUER+IMPEDIR+FIM+DE+ESCOLAS+RURAIS-122666

    ResponderExcluir
  5. Arrrrrre Fátima. Um artigaço. É isso aí mesmo. Gostei muito do que dizes: "culturalmente uma escola é um farol do saber e qualquer uma é sempre melhor do que nenhuma"

    ResponderExcluir
  6. A medida é polêmica, mas é uma saída. Claro que precisa ser avaliada depois. A instransigência dos professores é que destoa de tudo. Se eles esculhambam assim classes multisseriadas, é largar o emprego, deixando vaga pra quem quer ensinar na nova modalidade.

    ResponderExcluir
  7. Car@s, professores/as não são detentores/as do monópolio da verdade e nem da ética.
    Opinar sobre questões da educação é dever de cidadania de qualquer pessoa. Logo é abominável alguns argumentos que visam a desqualificar opiniões ditas leigas, tanto quanto dizer que a escola rural dos anos 2012 é MUITO diferente da escola rural dos anos 1960, ou que hoje a escola rural é outra em se tratando do seu caráter unidocente que em nada, ou quase nada, mudou no último meio século.
    Como livre-pensadora não estou acorrentada a nenhuma escola de pensamento, logo escrevo o que quero e opino sobre qualquer tema desde que o considero do meu interesse e do escopo do meu dever político e ético.
    Li e reli várias vezes todos os comentários onde o artigo foi postado. Infelizmente NENHUM aceitou debater com seriedade e em profundidade o tema que abordei. Lamento muito. Continuo achando que não é o fim do mundo a proposta do governo de Minas, embora eu seja defensora e lutadora “Por uma Educação Pública de Qualidade”, enquanto a luta continua, dos males o menor: qualquer escola é melhor do que nenhuma!
    Sobre os comentários do tipo esculhambação, a maioria de gente que se diz professor, são sofríveis e só evidenciam que há muitas mãos e bocas sujas conduzindo a educação de crianças e jovens brasileiros. Felizmente tenho a opinião que essa gente é minoria. Felizmente!
    Também não fujo da raia das polêmicas. Não é do meu feitio e não temo “pitbuls” da direita e nem da esquerda, afinal, como disse a filósofa Sueli Carneiro: ENTRE A DIREITA E A ESQUERDA EU CONTINUO PRETA!

    ResponderExcluir