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domingo, 1 de abril de 2012

1º de abril, toca o burro pro Anil


Fátima Oliveira
Médica– fatimaoliveira@ig.com.br @oliveirafatima_


Era um bilhete com tais dizeres que passava de mão em mão na sala de aula, com risinhos disfarçados, até que o professor ou professora vociferava: ''traga o papel que recebeu, agora!'' Como ''manda quem pode e obedece quem tem juízo'', quem estava com o bilhete o entregava. Quando quem o pedira, lia, não segurava e ria. E a sala toda gargalhava. Anil é um bairro popular histórico da cidade de São Luís.

maximojorge | minha escola no ano de 1908

(Fábrica de Fiação e Tecidos Rio Anil, hoje Centro Cultural e Educacional)



Era a brincadeira-mor do Dia da Mentira, o 1º de abril. Os mesmos dizeres, mas a gente adorava e hoje recordo com ternura. Não estava em meus planos escrever sobre o Dia da Mentira, mas não resisti. Era muita coincidência! É a primeira vez que a minha ''opinião'' sairá num 1º de abril. Um pouco de cultura inútil ajuda a desopilar o fígado das amarguras da vida.
Em inglês, o Dia da Mentira chama-se April Fool's Day (Dia dos Tolos); em italiano, Pesce d'Aprile; e em francês, Poisson d'Avril (Peixe de Abril). ''Tudo começou em 1564, quando Carlos 9, rei de França, por uma ordonnance de Roussillon, Dauphine, determinou que o ano começasse no dia 1º de janeiro, no que foi seguido por outros países da Europa. No início, a confusão foi geral, de vez que os meios de comunicação eram inexistentes. Não havia rádio, TV, nem mesmo jornal, pois a invenção da imprensa, por Gutenberg, só aconteceu muitos anos depois''.
Até Carlos 9 adotar o calendário gregoriano, o Ano Novo era celebrado, desde o século 16, na chegada da primavera. As festas iam de 25 de março até 1º de abril. ''Alguns franceses resistiram à mudança e continuaram a seguir o calendário antigo, pelo qual o ano se iniciaria em 1º de abril. Gozadores passaram então a ridicularizá-los, a enviar presentes esquisitos e convites para festas que não existiam. Essas brincadeiras ficaram conhecidas como 'plaisanteries'''. A mais comum era a carta, através de um portador, enviada para alguém, na qual se lia: ''Hoje é 1º de abril. Mande este burro pra onde ele quiser ir''. Oui, o burro ludovicense é o mesmo burro francês! Elementar, não? Afinal lá era a França Equinocial.
Mário Souto Maior diz que ''no Brasil o 1º de abril começou em Pernambuco, onde circulou 'A Mentira', um periódico de vida efêmera, lançado em 1º de abril de 1848, com a notícia do falecimento de dom Pedro, desmentida no dia seguinte. 'A Mentira' saiu pela última vez em 14.9.1849, convocando todos os credores para um acerto de contas no dia 1º de abril do ano seguinte, dando como referência um local inexistente.''
Há pegadinhas célebres do 1º de abril. Eis algumas: a África do Sul, sob a presidência de Nelson Mandela, comprou Moçambique por US$ 10 bilhões, segundo a ONU (jornal ''Star'', de Johannesburgo); a minúscula república russa do Djortostão declarou guerra ao Vaticano. Motivo: arrebatar o título de menor Estado da Europa (''Moscou Times''); ao deixar o Senegal, o presidente norte-americano Bill Clinton seria acompanhado de uma comitiva formada pelos primeiros 50 senegaleses que fossem à sua embaixada para pedir visto de entrada nos EUA. Centenas de senegaleses acreditaram na mentira e correram para a embaixada (''Le Soleil'', do Senegal).
Embalada pelas doces lembranças do meu tempo de escola de ''tocar o burro pro Anil'', tenho o maior cuidado com as notícias e telefonemas no 1º de abril. É costume passar trotes na data. É hilário e gosto. Tanto que, por ser 1º de abril, de algum modo dei uma passada de perna em quem me lê, pois escreveria sobre o meu novo livro: ''Reencontros na Travessia: a tradição das carpideiras'' (no prelo da Mazza Edições), que, mesmo sendo um romance, uma história de amor, desmonta uma mentira milenar: a de que carpir é um choro falso. Depois conversaremos mais, porém guardem: carpir é um dom.



 Publicada em O TEMPO e republicada no Portal Vermelho em 1º de abril de 2008

5 comentários:

  1. Muito legal e criativa

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  2. Gostei muito. Sou de São Luís eo 1o. de abril, toca o burro pro Anil é histórico e até hoje usado

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  3. Fátima, que texto legal, pois é memória pessoal e historia

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  4. Um texto agradável. Parabéns

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  5. Vixe, Fátima ,amei o texto e os amigos de Genaro.

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