(DUKE)
Fátima Oliveira
Médica –
fatima.oliveira1953@gmail.com @oliveirafatima
A greve geral das mulheres no 8 de Março passado, com
a adesão de mais de 60 países, incluindo o Brasil, onde ocorreu mais de uma
centena de manifestações, nos dá muitas esperanças na força e no poder do
internacionalismo feminista, apesar dos atropelos machistas e misóginos que nos
cercaram na data em nosso país.
Um deles, o goleiro Bruno, condenado por feminicídio,
em 2010, a 22 anos e três meses de prisão, foi solto! “Tirou” apenas seis anos
e sete meses de cadeia! Ele recorreu da sentença, e sua condenação virou prisão
preventiva, pois o recurso não foi julgado até a data da soltura, 24.2.2017.
Todo pimpão, declarou à TV Globo Minas: “Independente do tempo que eu fiquei
também, eu queria deixar bem claro, se eu ficasse lá, se tivesse prisão
perpétua, por exemplo, no Brasil... não ia trazer a vítima de volta”.
(veja o vídeo onde Eliza diz ter sido agredida por Bruno)
Como se cadeia fosse para ressuscitar quem os
assassinos mataram! É um assassino tirando onda de filósofo! Em 10 de março,
ele foi contratado pelo Boa Esporte, de Varginha (MG), a cidade dos ETs. Faz
sentido. É um escárnio, acobertado pela lei. É a segunda vez que o Estado
acaricia o criminoso goleiro: Eliza Samudio foi assassinada porque o Estado brasileiro, quando instado por ela a proteger sua vida, se omitiu: não compareceu para dar limites ao agressor, acariciando assim a onipotência dele.
Há quase três anos não moro em BH, todavia, na tarde
de 7 de março, fui “achada” por uma defensora pública de Uberlândia (MG), que
conduz um caso de gravidez pós-estupro e pedia socorro porque não encontrara
nas “muitas Minas” quem realizasse o aborto! Conforme relato da defensora
pública: “Uma moça de 20 anos está grávida após estupro. Desde então, vem em
peregrinação por hospitais da rede pública, para se submeter ao procedimento de
interrupção da gravidez, e todos se recusaram.
Ela chegou a ser encaminhada para um hospital em BH,
mas foi negado o atendimento porque supostamente este seria atribuição do
Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia, que, por sua vez,
já informou que não o faz”.
A
valorosa defensora já entrou com uma ação pedindo que o Estado providencie a
interrupção da gravidez; no entanto, não conseguiu a informação sobre quais
hospitais em Minas Gerais são credenciados para tanto. Cadê o governador de
Minas Gerais? Até 2010 havia lista pública de serviços de aborto prevista em
lei no Brasil, mas um ministro fundamentalista proibiu a divulgação dela! Só
sabemos que são 65 serviços e a lista sumiu!
A terceira miséria foi o chamado nem tanto subliminar
do atual presidente da República à formação das fiscais de Temer, ao dizer:
“Ninguém melhor do que a mulher para indicar desajustes de preços no
supermercado”, em meio a um discurso das entranhas da Idade Média, bem ao
estilo família “comercial de margarina”, ignorando as novas configurações
familiares no Brasil, onde 40% dos domicílios têm mulheres como pessoas de
referência, conforme a pesquisa “Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça”,
do Ipea. “Tenho absoluta convicção, até por formação familiar e por estar ao
lado da Marcela, do quanto a mulher faz pela casa, pelo lar. Do que faz pelos
filhos...” Ninguém merece ser reduzida ao papel de mulher-mala, aquela cujo
valor divino são os rebentos que pode carregar na barriga!
É um atraso que padrões culturais retrógrados dominem
mentes que têm poder e que, por dever de ofício, deveriam estar em sintonia com
a peleja “por um mundo de igualdade contra todas as opressões”.
PUBLICADO EM 14.03.17
FONTE: OTEMPO
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