Visualizações de página do mês passado

terça-feira, 8 de abril de 2014

O parto roubado é um conceito político de resistência

Adelir de Goes, 29, em fotografia publicada em rede social (Adelir Carmen Lemos de Góes)

Cesariana salva vidas, mas seu abuso viola direitos humanos
Fátima Oliveira
Médica -
fatimaoliveira@ig.com @oliveirafatima_

O parto é um evento e uma construção social. Parir é ato fisiológico que pertence à mulher. Não é um ato médico ou de obstetriz. O parto é cercado de ritos, rituais e crendices, conforme a cultura. “Assistir ao parto” é respeitar a sua natureza biológica, social, cultural e espiritual. As parteiras tradicionais, sabiamente, não dizem que “fazem parto”, mas que “assistem a parto”! Notaram a diferença?


  A assistência ao parto tem recebido influências culturais diversas e incorporado procedimentos tecnológicos invasivos ou não, aspectos patentes de medicalização, e uma gama de intervenções/controles externos. Não esquecendo que a medicalização é um poder político, há: 1) parto sem tecnologias invasivas; e 2) parto medicalizado: com ou sem hospitalização e com ou sem uso de tecnologias invasivas (drogas e outros procedimentos).
Parto normal não é sinônimo de parto desmedicalizado. Parto domiciliar nem sempre é sinônimo de parto normal. É senso comum que, em trabalho de parto, temos uma “mulher em sofrimento” e as pressões sociais, psicológicas e culturais da dor e do sofrimento favorecem a medicalização.
 
 
Parto1


A exigência ética
geral relativa ao parto
consiste em acolher
a sua natureza fisiológica e combater
a violência institucional
e profissional






Assistir ao parto exige competência técnica, humanística e ética. Vale para obstetras, obstetrizes e parteiras tradicionais, igualmente. Independentemente da cultura, e em respeito a cada cultura, a exigência ética geral relativa ao parto consiste em acolher a sua natureza fisiológica e combater a violência institucional e profissional. Cesariana salva vida, mas a indicação abusiva viola direitos humanos, violenta e mata!
O Brasil exibe 55% de cesáreas, quando a OMS recomenda até 15%; na rede privada são 84%. Logo, a maioria delas integra o altar dos partos roubados – aqueles em que o poder médico, a arrogância e a preguiça médicas não permitiram que acontecessem por via vaginal, naturalmente. Se há uma profissão que não combina com preguiça é a medicina! Cesáreas desnecessárias revelam uma única coisa: preguiça de assistir a partos!
 
 
Litoral tem novos leitos para tratamento de AVC (Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, Torres, RS)
Adelir e a filha tiveram alta na quinta-feira (03/04). Foto de Jonas Campos/RBS TV.
 
 
O preâmbulo é uma tentativa de entender o acontecido em Torres (RS), na madrugada do último dia 1º, com o casal Adelir Carmen Lemos de Góes e Emerson Lovari, com um filho de 7 anos e uma filha de 2 anos, nascidos via cesarianas, que desejava que o terceiro parto fosse natural, mas foram intimados (com ordem judicial, aparato policial e o escambau!) a retornar ao Hospital Nossa Senhora dos Navegantes. Ordem judicial não se discute: cumpre-se, mesmo com indícios de violação aos direitos reprodutivos, que integram os direitos humanos, como aparenta ser o caso de Torres!
 Havia uma indicação médica de cesariana, quando Adelir, com 42 semanas de gravidez, esteve no hospital, dia 31 passado, com lombalgia e dores no baixo ventre, e recusou a cesariana, assinando desistência. A maternidade apresentou denúncia ao Ministério Público.
 
 
Adelir Carmen Lemos de Goes com sua filha e o marido após a cesárea determinada pela Justiça, contra sua vontade (Foto: Arquivo Pessoal) 


Acionado, o promotor Octavio Noronha, de posse exclusivamente de dados fornecidos pela maternidade (feto em posição podálica – em pé no útero; gestação avançada, na 42ª semana; gestante com duas cesarianas prévias) e imbuído da compreensão leiga de que medicina é matemática, em que 2+2 dá sempre 4 – há outras opiniões médicas que desconsideram os dados como indicação de cesárea –, acionou a Justiça por medidas protetivas da gestante e do feto e antecipação de tutela. Adelir foi escoltada por nove policiais para a maternidade. Nasceu Yuja, de cesariana!
A judicialização da atenção obstétrica e neonatal está na praça. O que fazer? Prontuário médico fala, deve ser periciado com rigor!
 
 
140402-Gravida2 PUBLICADO EM 08.04.14
12 (DUKE) FONTE: OTEMPO




6 comentários:

  1. Foi um absurdo terrível! Foi um parto roubado, sim!

    ResponderExcluir
  2. Entendi tudo! Uma bandidagem sem nome!

    Polêmica no RS: A cesárea era mesmo a única opção?
    Rafael Barifouse,
    Da BBC Brasil em São Paulo
    Caso é debatido após dona de casa ter sido obrigada pela Justiça a fazer cesárea

    Na madrugada de terça-feira, a dona de casa Adelir Carmem Lemos, de 29 anos, foi obrigada pela Justiça a fazer uma cesárea por "risco iminente de morte" da mãe e do bebê, segundo as médicas que a examinaram no Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, em Torres (RS).

    No entanto, havia alternativas além da cesárea, segundo o Colégio Americano de Ginecologia e Obstetrícia (ACOG, na sigla em inglês), um dos principais órgãos que publicam diretrizes nestas áreas médicas no mundo.

    Adelir chegou ao hospital na tarde de segunda-feira se queixando de dores lombares e no ventre. A médica de plantão recomendou a cesárea imediata porque a gestação havia ultrapassado 41 semanas, o bebê estava sentado (assim, sua cabeça poderia ficar presa na pélvis da mãe, sufocando-o)
    ......
    Mas, segundo o ACOG, o parto normal pode ser uma opção quando o bebê está sentado, desde que o profissional saiba como lidar com essa situação e que a mãe aceite o procedimento, após receber informações detalhadas.

    O órgão ainda recomenda, em um documento de 2006, que obstetras ofereçam às mulheres um procedimento chamado "versão cefálica externa", uma manobra para reposicionar o bebê dentro do útero, fazendo com que ele fique de cabeça para baixo, a posição mais comum para o parto normal.

    "O certo teria sido sentar com ela, apresentar as evidências e tomar uma decisão conjunta", diz Melania Amorim, obstetra e professora da Universidade Federal de Campina Grande. "Se o médico não se sente capacitado, deve encaminhá-la para outra pessoa atendê-la."

    Intervenção
    Adelir só teve a opção da cesárea e a recusou. Foi liberada do hospital depois de assinar um termo de responsabilidade. Mas houve a troca de plantão, e uma segunda médica concordou com a recomendação de cesárea e pediu a intervenção do MPE.

    ........
    No entanto, o ACOG diz em um documento de 2010 que não há evidências conclusivas sobre o aumento de risco de ruptura da cicatriz uterina. Ele faz referência a dois estudos. O primeiro indica um risco similar entre mulheres que fizeram antes uma cesárea (0,7%) ou duas (0,9%). Um segundo estudo encontrou um risco maior, de 1,8%, para mulheres que passaram duas vezes pelo procedimento.

    "Se aceitamos fazer (a cesárea) em quem já fez uma vez, não há motivo para se negar quando já se fez duas vezes. Mesmo assim, os valores absolutos são muito baixos", diz a obstetra Melania Amorim. "Uma nova cesárea também traz riscos. Pode haver hemorragia, lesão na bexiga e intestinal e até ser necessário retirar o útero. A mulher deve ser quem decide qual risco será assumido."

    ....

    Ainda segundo o ACOG, seria recomendável, em um caso como o de Adelir, oferecer à paciente a possibilidade de tentar o parto normal. "Isso foi negado a ela, o que vai contra os protocolos e estudos científicos mais atuais", diz Maira Libertad, enfermeira obstétrica, docente e pesquisadora na área conhecida como medicina baseada em evidências.

    Quando Adelir voltou pela segunda vez ao hospital, ela já estava em trabalho de parto avançado. "O certo seria ter deixado o nascimento acontecer naturalmente", afirma Libertad.

    Ela discorda da posição do hospital a respeito dos riscos para mãe e bebê. "Se (a paciente tivesse) pressão alta com diabetes, seria válido, porque uma condição piora a outra. Mas, com estas condições citadas (posição do bebê e cesáreas anteriores), isso não acontece. Elas ainda assim deveriam ter sido avaliadas individualmente."
    .....

    Adelir queria fazer parte desta estatística. Ela saiu do hospital na última quinta-feira e já está em casa com sua bebê. Ambas passam bem. Seu marido, Emerson Guimarães, afirmou que acionará o hospital na Justiça.

    www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/04/140404_cesarea_debate_pai_rb.shtml

    ResponderExcluir
  3. Tudo muito doloroso, desrespeitoso e o governo do Rio Grande do Sul não deu nem upio. Uma vergonha

    ResponderExcluir
  4. Estou divulgando para todos os meus contatos

    ResponderExcluir
  5. Sem que as mulheres estejam empoderadas não venceremos o crime da cesáreas desnecessárias. Adelir Carmen Lemos de Góes sabia o que estava fazendo, resistiu o que pode, mas os juízes hoje em dia acham que são deuses. Juíza e promotor devem ser punidos

    ResponderExcluir
  6. Meu parto foi 'roubado', afirma mãe forçada a fazer cesárea no RS


    Internada desde a madrugada de terça (1), e obrigada a passar por uma cesárea por decisão da justiça, a dona de casa, Adelir Carmem Lemos de Góes, 29, disse ontem que pretende processar os médicos e hospital por não ter conseguido fazer um parto normal.
    "Tive meu parto roubado", disse por celular da enfermaria do Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, Torres, ( a 193Km de Porto Alegre ).
    Conforme revelou ontem, a mulher grávida de 42 semanas, foi levada por policias ao hospital para passar por cirurgia depois de a Justiça acatar um pedido do hospital da Promotoria que alegavam "risco iminente de morte" da mãe e da criança.
    A unidade de saúde voltou a defender ontem a avaliação de duas médicas e disse que já havia sofrimento do bebê. " A correção dessa indicação médica foi confirmado no parto, devido à presença de mecônio [fezes] do nenê na cavidade abdominal da mãe, demonstrando sofrimento fetal ".
    O promotor Octávio Noronha disse que a medida foi necessária devido à opinião "irredutível" da mulher. "A vida da criança não pode ser deixada em segundo plano".
    A polêmica começou quando a gestante foi ao hospital com dores. A médica determinou que ela fizesse uma cesárea. O bebê, disse, sentado, esse fato impedia um parto normal.
    Para a obstetra Melania Amorim, as justificativas para a cesárea são "um mito". O obstetra Coritio Netodiz que foram corretas.
    Após dar à luz a uma menina, Adelir disse não ter sido informada de havia riscos. Afirmou que, se houvesse perigo, não se recusaria a passar por uma cesárea, mas que não esta convencida de que isso era preciso.
    "Quis ouvir uma segunda opinião fora do hospital , mas negaram", disse "Não fui irresponsável. Sabia aquilo que foi o melhor pra nós".
    Mãe também de um menino de 7 anos e de uma menina de 2, ela informou que se sentiu "enganada" por médicos, nas gestações anteriores, quando passou por cesáreas.
    "Na primeira vez tive cesárea porque não tinha dilatação e na segunda pois estava com 41 semanas de gravidez. Só depois fui saber que não existe indicação real para a cesárea", comenta.Uma gestação completa dura de 37 a 42 semanas.
    Adelir diz que "cesárea, sempre é cesárea" é muito ouvida por gestantes que tentam o parto normal, e muitas mulheres acabam desistindo por segundo ela, falta de informação.
    "Estava esperando o parto estar mais ativo para ir ao hospital. Só fui lá para passar por uma avaliação. As próprias enfermeiras falam que, para conseguir um parto normal aqui [no hospital], só é possível se o bebê já chegar coroando", comenta . Ela conta que ser levada ao hospital, estava com 9cm de dilatação - a dilatação total é de 10 centímetros. "Mesmo assim fui pro centro cirúrgico", lamenta.
    Adelir reclamou ainda que seu marido não pode acompanhá - la no parto, apesar de lei federal que permite a presença do acompanhante. Ela disse ainda que foi insultada pela médica, que a chamava de "irresponsável".
    O caso da gestante ganhou repercussão após a doula dela, Stephanny Hendy, falar sobre a decisão judicial nas redes sociais. Várias ativistas do parto humanizado trocaram fotos no perfil com imagens na cor preta com a frase "a luta pelo parto está em luto". Elas começam a se organizar para fazer um protesto contra a decisão.
    A assessoria do hospital afirmou que não houve "agressividade" e que ele não pôde participar porque "exaltado".

    http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1435071-meu-parto-foi-roubado-afirma-mae-forcada-a-fazer-cesarea-no-rs.shtml

    ResponderExcluir