Evidente a coragem dos signatários, todos da elite mineira
Fátima Oliveira
Médica - fatimaoliveira@ig.com @oliveirafatima_
Minas Gerais celebra com múltiplas homenagens os 70 anos do Manifesto dos Mineiros, intitulado “Ao povo mineiro”, lançado em 24 de outubro de 1943, tendo como signatários iniciais 76 nomes, que depois passaram para 92. O documento tem seu lugar na história pelo reconhecimento de que foi, efetivamente, o segundo passo, visível e ostensivo, contra a ditadura do Estado Novo e pela redemocratização do país. O primeiro passo foi a passeata da UNE, em julho de 1942, com expressiva participação popular, exigindo a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, com vistas a forçar o governo a aderir aos Aliados, pois, como é de domínio público, Vargas flertava com o Eixo, tanto que os principais nomes do seu governo eram ostensivamente alinhados com ele!
(Manifestação da UNE em 1942 pela entrada do Brasil na guerra)
Eram tempos tenebrosos, de vozes silenciadas e Congresso Nacional fechado. Basta rememorar a história do Brasil sob a vigência da ditadura Vargas (1937-1945), guiada pela Lei de Segurança Nacional, aplicada ferreamente pela polícia política de Filinto Müller (1900-1973). São razões suficientes para evidenciar a coragem dos signatários, todos da elite mineira e de ideais liberais – intelectuais, advogados, médicos, comerciantes, fazendeiros, industriais –, grande parte oriunda da Aliança Liberal, surgida no bojo da Revolução de 1930, como bem diz Fernando Luis Battistini Silveira, em “Estado da Arte: Manifesto dos Mineiros”: “A Revolução de 1930 traz consigo o surgimento da Aliança Liberal, formada por políticos ansiosos quanto à instalação de uma nova forma de governo, em detrimento das políticas da chamada República Velha. Apesar de vitoriosa no golpe de 30, Vargas não segue os interesses liberais de parte da sua base política. A implantação do Estado Novo veio para deixar claro o rompimento entre Getúlio e sua base liberal.
O documento tem seu
lugar na história pelo
reconhecimento de
que foi o segundo passo,
contra a ditadura do
Estado Novo e pela
redemocratização do país.
(Pedro Aleixo, Milton Campos e Magalhães Pinto, nomes de destaque entre os signatários do manifesto que reivindicava o fim do Estado Novo)
Considerados traídos com o surgimento do governo autoritário, esses políticos nada puderam fazer para questionar o poder de Vargas. Contando com o apoio do Exército, que em sua trajetória assume um papel preponderante no cenário nacional, através de censuras e propagandas que garantiam somente a publicação de materiais de interesse do ditador, os antigos membros da Aliança Liberal pouco podiam expressar sua opinião”.
Otávio Soares Dulci, citado por Fernando Luis Battistini Silveira, em artigo de abril de 2006 para a revista “Nossa História”, “considera também o texto da ‘carta aos mineiros’ bastante moderado, concordando com os outros autores de que o reconhecimento do documento se deve justamente nas atitudes repreensivas adotadas pelo governo”; além do que, “entende o Manifesto dos Mineiros como uma disputa de ideologias para a futura democracia brasileira do pós-guerra. Ao contrário da democracia trabalhista que Vargas almejava realizar, os signatários pensavam em uma democratização liberal (entendida principalmente pelo rompimento com as medidas trabalhistas adotadas por Getúlio), onde o Estado não daria vantagens a nenhuma das classes”.
(29 de outubro de 1945)
(JB, 30 de outubro de 1945)
Não há dúvida quanto ao caráter laudatório da democracia constante no Manifesto dos Mineiros, mas há que se destacar a sua acentuada marca regional, embora tenha circulado no Rio de Janeiro, em São Paulo, na Bahia e em Pernambuco, bem como o seu inegável caráter de classe e de disputa ideológica: pois a maioria dos assinantes se filiou à União Democrática Nacional (UDN), criada em 7 de abril de 1945, em oposição frontal a Vargas.
Enfim, pés no chão para não distorcer a história: nem tanto ao mar e nem tanto à terra!
Enfim, pés no chão para não distorcer a história: nem tanto ao mar e nem tanto à terra!
(Em
pronunciamento, governador destacou a importância do Manifesto dos
Mineiros - Renato Cobucci/Imprensa MG)
PUBLICADO EM 05.11.13
FONTE: OTEMPO
FONTE: OTEMPO
Fátima Oliveira foi no cerne do assunto! O PSDB mineiro, na pessoa do governador Anastasia, está comemorando os 70 anos do Manifesto Mineiro e comparando a conjuntura da Ditadura Vargas com o governo Dilma. É um abuso
ResponderExcluirFátima Oliveira finaliza a sua crônica afirmando: "Enfim, pés no chão para não distorcer a história: nem tanto ao mar e nem tanto à terra!"
ResponderExcluirMuito bem, olhem o que escreveu o governador de Minas:
A contemporaneidade do manifesto mineiro de 43, por Antônio Anastasia
Antônio Anastasia
O Manifesto dos Mineiros, corajoso e lúcido brado liberal contra ditadura do Estado Novo, completa 70 anos.
Publicado em 1943 na forma de panfleto clandestino, que chegava às famílias pela fresta das portas, o documento começou a circular em 24 de outubro exatamente para marcar o aniversário da Revolução de 1930 - e assim lembrar à Nação o ideário de reformas, então soterrado, que levara Getúlio Vargas ao poder.
Guardadas as diferenças - hoje vivemos em plena democracia, sob uma Constituição Cidadã -, essa brilhante análise do passado, assinada por 92 líderes políticos, intelectuais e empresariais de Minas Gerais, traz reflexões preciosas para a conjuntura atual.
Por sua importância para a reconquista do Estado de direito no pós-guerra, o Manifesto dos Mineiros tem, como iniciativas nossas que a precederam, seu lugar na história do Brasil.
Nas comemorações do 21 de Abril deste ano, quando celebramos a Inconfidência, citei um trecho do Manifesto. Aquele que dizia que o amor à crítica e ao debate, o apego à cidadania e a irresistível vocação para a vida pública são orgulho, mas não privilégio dos mineiros.
Combatemos em 1708, 1720, 1789 e 1842 sem arroubos de anarquia, conservando a honra e construindo a ordem da justiça a fim de garantir sempre mais liberdade. Um sentimento que não é regional, mas nacional: de brasileiros que também lutaram, de Norte a Sul, batalhas diversas pela nossa independência.
Voltando ao século XX, o Manifesto de 1943 reafirmou a condenação de violências, arbítrios e corrupções da República Velha – métodos políticos ainda hoje não completamente superados. Para, em seguida, repudiar duramente a permanência do regime de exceção, inaugurado com o golpe de 1937. Seus autores foram perseguidos e perderam suas funções públicas e empregos privados.
Nossa decisiva colaboração para pôr fim a períodos ditatoriais se faria presente novamente na criação da Nova República, quando Tancredo Neves deixou o Palácio da Liberdade para liderar em 1985, como primeiro presidente civil após duas décadas de regime militar, o processo de redemocratização do país.
Numa interessante similitude ao momento de intensas manifestações populares que vivemos hoje, os ilustres de Minas alertavam, nos idos de 1940, para a importância de se ouvir a sociedade, pois o banimento das atividades políticas e cívicas forjava uma estabilidade ilusória.
“Um povo reduzido ao silêncio é um organismo corroído”, ensinavam. “Só não desejam mudar os homens que estão tranquilos. Os que sofrem são ávidos de coisas novas.”
O manifesto louvava a democracia, reafirmando não haver solução fora dela. Clamava ainda pelo cumprimento das garantias constitucionais, capazes de trazer segurança e bem-estar para todos, sem que o patrocínio oficial favorecesse corporações e dividisse em facções os brasileiros.
Também preconizava uma reforma que democratizasse a economia, reduzindo o mando do Estado. Por fim, exortava a tolerância entre as forças políticas: “União não é unanimidade forçada nem soma de adesões insinceras.” Questões mais do que oportunas 70 anos depois.
Antônio Anastasia é governador de Minas Gerais pelo PSDB.
http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2013/10/24/a-contemporaneidade-do-manifesto-mineiro-de-43-por-antonio-anastasia-512996.asp
Uma avaliação sensata, respeitando o contexto e os limites nas quais a carta foi escrita e, muito mais, a ideologia dos signatários
ResponderExcluirÉ o primeiro texto que contextualiza o Manifesto dos Mineiros em seu tempo. O governador Anastasia comeu bola. Não há nenhuma contemporaneidade. Os contextos são incomparáveis. O que também me leva a crer que o intuito das comemorações foi levar água para o moinho do Aécio Neves. Coisa feia e triste. Mas os tucanos usam expedientes assim há muito tempo. Quando lhes faltam discursos inventam um.
ResponderExcluirMuito bom o artigo, pois destaca os méritos do Manifesto dos Mineiros num momento difícil do nosso país e ao mesmo tempo pontua que era uma luta de muita gente corajosa
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