Na Bulgária, Dilma visitou museu em Gabrovo, onde nasceu o pai, Pedro, com exposição sobre as origens da família Rousseff (Foto: Roberto Stuckert Filho/PR)
Fátima Oliveira
Dona Lô e Ducarmo, a publicitária amiga dela dona de agência de viagens que cuidou da ida das mulheres da Chapada do Arapari para a posse de Dilma em Brasília, viraram “unha e carne” e não param de inventar modas...
Vivem cavucando coisas pra colocar a Região da Chapada do Arapari no mapa turístico do Maranhão! Coisa que não é exatamente fácil porque, de modo geral, a Chapada do Arapari sequer existe para as autoridades...
Foi assim que ambas realizaram uma cavalgada para os festejos de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, num povoado perdido no meio da mata, a quase trinta quilômetros da fazenda Matinha de Dona Lô.
(Estandarte de Nossa Senhora do Rosário -Terno de Moçambique de Carmópolis de Minas - MG)
Pra quem não se lembra, o Dia de Nossa Senhora do Rosário é 7 de outubro. Os devotos da santa comemoram a data em todo o mundo. “Muita gente pensa que a Nossa Senhora do Rosário é coisa brasileira do tempo da escravidão. Pois né, não! Apenas aqui os escravos, de modo muito inteligente, adaptaram a devoção da santa às suas lutas. Mas o nome Nossa Senhora do Rosário dos Pretos já existia! De fato a historia nos diz que ‘A devoção a Nossa Senhora do Rosário tem sua origem entre os dominicanos, por volta de 1200. São Domingos de Gusmão, inspirado pela Virgem Maria, deu ao rosário sua forma atual. A primeira irmandade do rosário foi criada pelos dominicanos em Colônia (Alemanha), em 1408. A devoção chegou ao Reino do Congo, através dos missionários portugueses. A irmandade do rosário (dos brancos) chegou a Lisboa em 1478. A mais antiga menção a uma ‘Confraria de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos’, data de 14 de julho de 1496, ou seja, quatro anos antes de o Brasil ser descoberto!”.
Era o que dizia Dona Lô, por telefone, quando convidou Ducarmo para a Cavalgada de Nossa Senhora do Rosário, saindo da Matinha de Dona Lô até ao povoado Quati dos Pretos.
– No Brasil, a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário chegou no século XVI. Assim é que em Santos, em São Paulo, a padroeira é Nossa Senhora do Rosário. Depois, no século XVII, ela passou a ser padroeira de Itu, Parnaíba e Sorocaba. Mas a primeira igreja construída no Brasil em sua homenagem foi Igreja de Nossa Senhora do Rosário, em Paranaguá, em 1578.
– ... – Ducarmo, minha filha, desejo a sua companhia na cavalgada de 6 de outubro. Se não gostar de montaria, vá no carro de apoio. Coisa pequena. Umas vinte pessoas a cavalo... Cavalgada curta, quase 30 Km da porta da Matinha até lá... Vou pagar uma promessa que fiz pra Dilma ganhar no segundo turno. O aperto faz coisa, menina! Até eu que não sou, a rigor, uma santeira, me vi ajoelhada implorando a tudo quanto é santo e santa! Juro, nas eleições passadas me vi fazendo promessa a tantos santos que perdi a conta! Só mesmo Dilma para me obrigar a isso! A rigor, sou agnóstica.
– ...
– Eu aqui no maior desespero porque perdemos as eleições no primeiro turno... Ô 3 de outubro triste, nossa sinhorinha! Estava com o coração quase parando quando o celular tocou. Era Seu João do Quati dos Pretos – um povoado antigo, onde todo mundo trabalhou pra meus antepassados, mas hoje em dia é um povo bem de vida e que há muitos anos não precisa mais de trabalhar alugado. O lugar é tão antigo quanto a Chapada do Arapari. Surgiram quase ao mesmo tempo. Meu bisavô dizia que o Quati dos Pretos era irmão de nascimento da Matinha de Dona Lô original.
– ...
– Pois bem, Seu João do Quati dos Pretos convidou-me para os festejos de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos. No povoado há uma capela com esse nome... A festa seria no 7 de outubro. Agradeci, mas ele insistiu, dizendo: “Pois Dona Lô, preciso que Vosmicê venha em nossa festa antes que ela acabe. Talvez num se alembre, pucardiquê ficou muito tempo fora da região, mas nossa festa existe quase da mesma era da de Santa Luzia da Matinha de Dona Lô! Mas tá acabando. Vosmicê sabe que isso de festejar santo é coisa dos troncos velhos. Esse povo novo da gente não se importa mais com isso. Só quer saber de morar na cidade. Vosmicê é sabedora que meu avô foi tropeiro de seu bisavô e se apaixonou por uma cabrocha dessas bandas e cá sentou morada, no mesmo lugarzinho onde hoje é o Quati dos Pretos, nome dado por ele. A nossa terrinha foi conseguida com muita ajuda do seu bisavô, o Velho Chico Tropeiro... Amizade que passou pra seu avô, Neneco Tropeiro, e continuou com seu pai, o Dotozim Felipe Tropeiro. Donana veio muito aqui, mas Vosmicê só veio no tempo de menina. Era coisa bonita de se ver! Todo mundo corria prumode ver Dona Lô ‘muntada em seu cavalim’ chegando no Quati dos Pretos, puxando a comitiva que vinha para festa de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos! Nunca mais se viu uma menina cavaleira que nem Vosmicê!
– ...
– Bonito demais, né não Ducarmo? Pois bem, foi aí que me apaguei com a santa e prometi a Seu João que em 2011 eu levaria uma comitiva para festa. E vou levar! Quer ir Ducarmo? Mas, como não existe “almoço de grátis”, você vai pra espiar como podemos divulgar essa festa, fazê-la conhecida e prestigiada. Mexer nos miolos do povo, que isso é coisa que a publicidade bem sabe fazer, pra passar a frequentá-la...
– Dona Lô, me diga aí: quantas promessas a senhora fez pra Dilma ganhar as eleições e quantas faltam pagar?
E riram...
– Honestamente Ducarmo? Mulher, perdi a conta! Anotar, até que anotei. Mas de vez em quando bate na memória uma que esqueci de anotar no “afregelamento” daqueles dias terríveis! Das que eu não lembrar de pagar, o santo ou a santa vai ter de perdoar. Acho que o jeito é fazer uma festança de pagamento de promessa no Dia de Todos os Santos... É o jeito, pra santo nenhum ficar amuado... Taí, você acabou dando uma ideia muito boa! Eita aperto! Foi tão grande que eu me apaguei a tudo quanto foi santo. Até o rosário de lágrima de... ah, esqueci, é um matinho, um capim, de minha bisavó eu andei com ele entre os dedos... Eis a verdade nua e crua!
– Está bem Dona Lô! Então vamos acertar os ponteiros. A festa será no dia 7, uma sexta-feira. Significa que a cavalgada sai da Matinha no dia 6, na quinta-feira...
– É isso mesmo! Sairemos depois do almoço. Lá pelas 15:00. Vamos devagar, na sombra, na maciota, no passo de cavalo, passarinhando, contando prosa... Chegaremos ao Quati dos Pretos na boquinha da noite. De certeza muita comida de espécie, um bom tocador de sanfona e muita prosa boa nos esperam...
– ...
– Esse povo quatizeiro tem uma tradição meleira antiga – são criadores de abelhas sem ferrão, desde os tempos antigos. Mamãe sempre falava deliciada de uma carne de lata com mel e pimenta malagueta que faziam por lá! Ah, e também são criadores de peixe num açude. Meu avô dizia que a melhor traíra no mundo era a do açude do Quati dos Pretos! Ah, não precisa ficar com medo Ducarmo, pois a cavalgada é só de ida! Os cavalos vão voltar num caminhão-gaiola. Não tenho mais idade e nem energia de voltar a cavalo...
A Festa de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos
E os festejos foram como o esperado, desde a tocação de foguetes na chegada. Um jantar de arroz misturado com feijão verde, traíra sem espinho bem fritinha e muitas frutas. Tudo farto, a folote.
O dia amanheceu sob um foguetório monumental e ao som de uma bandinha de música rudimentar. Não mais que tambores e um pífaro. Foi servido um lauto café matuto – beiju, cuscuz de arroz e de milho, batata doce e inhame cozidos, leite, café, chá de erva-cidreira e garapa de cana moída na hora! – na casa principal, onde mora Seu João do Quati dos Pretos.
Em seguida, uma procissão da santa até ao pequeno cemitério, onde estão enterrados os troncos velhos do Quati dos Pretos. Segundo Seu João é uma demonstração de que seguem a tradição de cultuar a santa... Um modo de agradecer à santa e aos ancestrais.
“Vosmicê sabe né Dona Lô, meu bisavô era da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, lá em São Luís. A devoção à santa é antiga em nossa família. Os filhos foram se espalhando pelo mundo e não esqueceram a nossa santa; e a festejam como der, mas festejam! E o ponto alto é o coroamento do Rei e da Rainha da festa e a tiração do rosário. Se a gente encontra um padre que queira dizer uma missa, tem missa; se não, a gente festeja ao nosso modo mesmo sem precisar de padre”!
Ao ver o Rei e a Rainha puxando o cortejo da procissão até ao cemitério, Ducarmo cochichou com Dona Lô: “Mulher, há Rei e Rainha, como nos congados, nos terços de congados, no candombe... Disso eu entendo um pouquinho, pois andei estudando os tipos de congados, antes de vir pra cá. Li um ensaio do Frei Chico, chamado “Congado: origens e identidade”, que diz: ‘No congado há vários grupos: o candombe é o mais antigo e o mais banto; depois vêm moçambique, congada, marujos, caboclinhos, catopês, os cavaleiros de São Jorge. Em Araçuaí (MG) têm os tamborzeiros; lá ninguém fala ‘congado’ e sim ‘tamborzeiros do rosário’! Aqui, talvez possamos dizer que há ‘tamborzeiros do rosário’, quem sabe, né não?
Mas houve missa, celebrada pelo padre que é “político” com Dona Lô! Ducarmo ao vê-lo pensou: “Eles estão porfiando... Dona Lô avança na proteção às manifestações do catolicismo popular na região... E o padre tem medo, porque perde poder!”
Após a missa, já quase meio-dia, foi servido o almoço. De tudo, um pouco: o prato principal era cozidão de carne de boi com quiabo, abóbora e maxixe, complementado com um naco de cabrito assado na brasa; e a famosa carne de lata com mel e pimenta malagueta estava em uma mesa para quem desejasse se servir de um pedaço.
(Gabrovo, Bulgária)
As prosas na Matinha...
Ducarmo ficou com Dona Lô até domingo. Na sexta-feira já dormiram na Matinha. Conversa pouca. Estavam só os farrapos, de cansaço. Acompanhar a cervejada de Dona Lô não é pra qualquer pessoa. Foi o que pensou Ducarmo...
No sábado cedo chegou Estela com sua catrevagem... Como de costume queria saber de tudo, nos mínimos detalhes. O que cansa Dona Lô: “Ô Estela, minha filha, na próxima festa é o jeito você ir. Só há um meio de saber tudo timtim por timtim de uma coisa: é estar presente! E vamos mudar de assunto porque Ducarmo ficou aqui pra gente arquitetar umas coisas. E deixamos pra hoje. É por isso que Ducarmo está aqui!”.
Pedro não conteve o riso: “E o que as madames estão aprontando?”
– Quieto Pedro! Está doidinho para comentar a viagem de Dilma à Bulgária, seeeeeeeeeeeei! Tô te lendo... Tô sabendo, viu? Pra que você fique calmo e aguente esperar, saiba logo que achei da maior beleza! Ela não poderia ir à Europa e não pisar em Gabrovo! Cultuar a nossa ancestralidade diz tudo do nosso caráter. Foi uma das mensagens que eu quis passar pras crianças quando decidi fazer “Um café búlgaro-mineiro para celebrar Dilma na ONU”.
– ...
(Museu, Gabrovo, Bulgária)
(Toshka Kovacheva )
(Primas búlgaras de Dilma: Toshka Kovacheva e Vesela)
– Sem falar que os búlgaros não se cansam de dizer que Dilma tem muito do modo de ser das búlgaras de nascença. Assim acha o prefeito de Gabrovo, Nikolay Sirakov: “A mulher búlgara é forte, brava, capaz de administrar uma família inteira sozinha (...) Já ouvi falar que, no Brasil, ela já foi criticada pelo temperamento forte. Aqui é bem diferente, isso é visto como uma qualidade nas mulheres".Estela não se conteve e aparteou: “É muito interessante que na Bulgária as mulheres expressam a identidade de personalidade que acham ter com Dilma. Por exemplo, Krassimira Cholakova, que organizou ano passado uma exposição sobre a família de Dilma em Gabrovo, falou que “Nós, búlgaras, só paramos uma tarefa quando terminamos tudo. Somos capazes de fazer um projeto de vida a longo prazo e só mudarmos de foco quando conseguimos o que queríamos (...) Acho que ela é exatamente assim, e não tenho como negar que quando soube dessa característica dela, pensei: só podia ser meio búlgara!”
– ...
(Nikolay Sirakov, prefeito de Gabrovo, aponta onde ficava a casa da família do pai de Dilma - Foto: Lúcia Müzell/Especial para Terra)
– E não acaba aí. Tem mais! “Uma prima de segunda geração de Dilma, a única descendente da família Russev que ainda mora na pequena cidade, confirma que, embora Dilma nunca tenha posto os pés na Bulgária, o seu temperamento a aproxima dos parentes que permaneceram no leste europeu. ‘Uma das tias dela, a Pia, era exatamente assim: forte, batalhadora. Sempre tinha a última palavra’, conta Toshka Kovacheva. ‘Eu acho que Dilma a lembra um pouco fisicamente também’”.
(Dilma Rousseff vira capa de revista na Bulgária)
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– Quem não liga pros seus, não merece consideração nenhuma! É isso... Ademais – e preste atenção quando uso a palavra ademais, que não estou chamando a atenção para meros detalhes – não podemos ter dúvidas de que Dilma foi criada numa casa com muito da cultura búlgara – então ela tem o direito de conhecer suas origens, in loco... Ou, não? Ainda mais agora que tem neto a quem transmitir valores...
–...
– Também tá aí de cachimbo inchado porque não foi pra cavalgada, não é? Se conforme que vai chegar o tempo em que mandará em sua semana. Por enquanto, é vida de empregado mesmo! Quem trabalha e bate ponto, não tem como ir a tudo que quer em dia útil. No próximo ano você irá, porque o Dia de Nossa Senhora do Rosário deve dar num sábado. Aí você enforca a sexta, né não?
Risadas gostosas...
– “Quem é vivo é mortal”. E como sei disso e que gente não fica pra semente, tenho a preocupação de não deixar que algumas tradições do povo morram. Então chamei Ducarmo para oferecer-lhe um trabalho: vamos mapear esses festejos de santos daqui da redondeza pra agência dela dar um trato publicitário.
– Publicitário? Todos os Santos, valei-me!
– É isso mesmo Pedro! Faremos um calendário de turismo religioso de nossa gente daqui. E muito mais! Se tudo der certo, Ducarmo vai trabalhar pra trazer gente pra ver essas coisas bonitas que nosso povo sabe fazer. Vamos começar pela Festa da Imaculada Conceição de Maria, agora no 8 de dezembro...
– ...
– Só que estou lembrando, assim de cabeça temos festas religiosas a dar com os paus. É muita coisa da tradição religiosa do nosso povo. Veja aí:
Nossa Senhora da Imaculada Conceição de Maria (8 de dezembro), na Chapada do Arapari;
Romaria de Santa Luzia (13 de dezembro), na Matinha de Dona Lô; Reisado (6 de janeiro), na Chapada do Arapari; a Semana Santa aqui na Chapada tem o que se vê a semana inteira, desde o Domingo de Ramos, com a Ladainha e aspersão de água benta nos ramos, na Capela de Nossa Senhora da Imaculada Conceição de Maria); na Quinta-feira Santa há o Drama: Lava-pés, no adro da Capela; na Sexta-feira da Paixão, a Ladainha na Capela de Santa Luzia, na Matinha de Dona Lô; no Sábado de Aleluia temos a Malhação de Judas, no adro da Capela; e no Domingo de Páscoa, a partir de agora de 2011, o Drama: “As mulheres na ressurreição de Cristo”, também no adro da Capela, seguido do belíssimo “Almoço Comunitário de Páscoa da Chapada do Arapari”, que em 2011 foi o 6º.!– ...
– Depois, em junho, fora a fogueirança em tudo quanto é povoado, para São João e São Pedro, que são manifestações que Ducarmo precisa estudar bem, pra ver as mais afamadas, há a Festa Portuguesa de Tonico pra Santo Antônio, que é assim um espetáculo digno de se ver! Ah, temos em maio muita coisa do mês de Maria! É coisa a dar com os paus. Nem conheço direito, pois como tenho dito: “O mês de maio foi todo de rezação para a Virgem Maria. Ainda bem que a família Tropeiro não se meteu em nenhuma delas, desde sempre. Mas sempre acabo tendo que dar uma ajuda pras rezas; ou seja, uns cafés, uns bolos, por aí... Estamos metidos do mesmo jeito. Sempre colocando um calço de dinheiro aqui, outro ali, outro acolá... Se eu não tivesse minhas economias herdadas dos troncos velhos dos Tropeiros eu estava era n’água. Afogadinha, afogadinha...”
– E o banquete de Estela? Esqueceu Dona Lô? É também uma tradição da Família Tropeiro rsrsrsrsrsrsr...Tem mais: A Vadiação de vaqueiros na Matinha de Dona Lô, no mês de julho, que é assim que nem uma religião. Ih, as tocação de boiada que a senhora curte, também... Falando nisso, nossa presidenta até agora não falou um “O” sobre a preservação do gado pé-duro...
– Hem-hem... Santíssima, como Estela pode se apaixonar por uma pessoa que nem você, hein Pedro! C’os diachos! “Vá bispar macaco-prego lá em Caburé”, vá!
(Caburé: o paraíso dos Lençóis Maranhenses)
– Brincadeirinha sogrinha! Perdão, mas chega de tratar de negócios. Cê já tem dinheiro demais, cofos e cofos, pra que quer ganhar mais?
– Pra quê? Ô pergunta-anta! Pra sustentar o teu ócio na velhice! Estela é praticamente a única herdeira da Família Tropeiro.
–...
– Fora que mamãe mandou dar pra Cesinha a casa da Chapada; gastar o que for preciso até ele ser juiz de direito; e em sendo juiz, terá direito a uns bons hectares de terra no fim da Matinha, aquele pedaço que papai chamava de Cacimbas em Flor, que acho que são quase 100 hectares, dá uma boa fazendinha; doar para o povo da Chapada a Capela de Nossa Senhora Imaculada Conceição de Maria, depois que eu morrer...
–...
– Pronto, agora já sabe que não vai herdar tudo, só quase tudo. O gado e os outros animais? Ainda vou decidir o que fazer... Mas de certeza, só Cesinha se importa com meu gadim pé-duro, meus cavalos, burros, mulas e jumentos, que são coisas que não dão dinheiro, só prazer. Ficarão pra quem sente prazer em lidar com eles, não acha?
– Ih, Dona Lô, fadigue não, mulher! Deixe esse negócio de herança pra lá! Vamos prosear um pouquinho de política. Gosto! Por mais que não ache, tenho sempre suas opiniões em alta conta. Venho aqui para reabastecer meus neurônios. Cê sabe e gosta. Sou sua voz lá na rua! Nunca falo nada de política que a senhora não falaria, juro!
– Eu sei! Desculpe nossos arroubos, viu Ducarmo! Fala aí, Estela! Tá calada pucardiquê?
– Como falar se a senhora e Pedro não deixam?
Estela bota freios em Pedro e em Dona Lô
Risadas desanuviadoras do ambiente que estava carregado... Assim pensou Mãe Zefinha, que a tudo assistia como se estivesse cochilando na cadeira, mas todos viram que ela estava muito atenta: “Ô dr. Pedro, Vosmicê até que podia largar dessas brincadeiras bestas com Lô, viu? Vem pra cá só pra atentar, siô! Pucardiquê num vai pra casa de seus pais de vez em quando? O que é seu tá guardado, siô! Num precisa se avexar, não! Dê mais uma assistenciazinha pra seu pai e sua mãe, que já estão velhos... Vá lá de vez em quando... Me adesculpe Lô, mas eu precisava de dizer isso pra dr. Pedro. Minha língua vem coçando faz é tempo...”
Estela rompeu o silêncio sepulcral que se seguiu à fala de Mãe Zefinha...
Ministra Iriny Lopes se diz estupefata com 'ridicularização' após propaganda com Gisele e detona piadas de Rafinha Bastos. Foto: Valter Campanato/ABr
– Até que eu queria falar dessa coisa da publicidade da Hope, sobretudo do aproveitamento que a mídia conservadora tem feito, que beira ao ridículo... Há um colunista daquela revista Oiá que extrapolou... Escreveu: “Gisele Bündchen em dose tripla: este post é só para chatear a chatíssima ministra Iriny”. Comentam também que um senador da base aliada disse que Iriny era uma ministra-jumenta, não no sentido daquele maranhense, Caetano Costa, que chamou o presidente JK de presidente-jumento, coisa que talvez seja usada para dizer que ele estava elogiando a ministra, pode até ser uma saída... A que mundo chegamos! Puro mangue pútrido... E há muitas outras manifestações de desrespeito à ministra... Ela até deu uma entrevista sobre tal aspecto.
[P.S.: em 13.10.2011: Twitter de Zezé Perrella dizendo grosserias à ministra Iriny é falso]
– ...
– Ora a Secretaria da Mulher, ao receber mensagens de desconforto de muitas mulheres sobre a propaganda estrelada por Gisele Bündchen, não fez mais do que a obrigação quando pediu ao CONAR (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária) que apurasse a desvalorização da mulher naquela publicidade! O resto é fricotagem conservadora. Geeeeeeeeente, até o Serra quis seu pedacinho ali para cacetear o governo Dilma. Defendeu a publicidade e a Gisele e pau no governo! Piração total. Foi um horror!
– ...
– Confundem liberdade de expressão com a irresponsabilidade de falar cobras e lagartos, sem provas, e ficar por isso mesmo... Li hoje cedo na internet um artigo de Marcos Coimbra que vai muito nesse rumo, ao dizer que que “O tom patético nas críticas à iniciativa da SPM foi dado pela ideia de que ela negaria a ‘leveza de espírito e o bom humor’ da ‘alma brasileira’. Como se houvesse apenas uma, monolítica e imutável, incapaz de aprender com seus erros, de evoluir e de amadurecer/Só se for para quem acha graça nas velhas piadas que ridicularizam mulheres, negros, indígenas, portugueses, nordestinos, homossexuais, loucos e deficientes”.
Print do twitter oficial de José Serra.
– Ora Estela, por que você diz até o Serra? O Serra já é um rei nu e deposto. Na campanha eleitoral passada ele se revelou a pior espécie de gente que há: atacou direitos humanos de mulheres, de homossexuais e o escambau. E o fez porque sempre pensou assim. É que escondia... Não é surpresa. Como não será surpresa se até Pedro, esse seu maridão aí, pensar que nem o Serra...
– Dindinha, chega! A senhora e o Pedro vivem na disputa... Dão ares de brincadeira, mas sei que é sério... Tia Donana dizia que eu precisava tomar as rédeas disso porque ambos têm muito cúme de mim. Eu amo os dois, e muito! Logo, não entendo ser o móvel dessa coisa horrível entre vocês... Mãe Zefinha fez bem em dizer o que disse ao Pedro! Alguém precisava chamá-lo nas catracas, oxê! Ele quase nunca vai à casa dos pais dele e depois quem escuta, diretas e indiretas, sou eu! Bem sei.
(Feijão tropeiro vivo)
– Tem razão Estela, de minha parte, prometo aceitar suas rédeas; quanto ao moço, sabe Deus! Ô Maria Helena, por favor, traga ligeirim mais uma cervejinha estupidamente gelada, que a minha esquentou! E refaça os comes aqui, minha rosa... Pode trazer um tira-gosto de comida viva também: um “feijãozinho tropeiro vivo” vai pegar bem pra dedéu agora. Eu sempre fico com uma foooooome quando Mãe Zefinha dá os “esbregues” dela...
(Comida viva)
E deu uma sonora gargalhada. Ducarmo ria, entre atônita e deliciada, com as encrencas familiares, existentes em todas as famílias... Na sua não era diferente. Rusgas, rusgas e mais rusgas, mas a casa familiar original é sempre um regaço reconfortante para a maioria das pessoas... E ela sabia que estava numa bem original... E que historia mais estranha essa de feijão tropeiro vivo! Essa Dona Lô, essa Dona Lô...
(Dilma em Gabrovo, Bulgária)
Depois de um breve silêncio após os limites dados, Estela prosseguiu: “Da viagem da Dilma a Gabrovo, assim como Dindinha, também achei da maior propriedade... Uma ida às raízes. Às suas raízes. Foi emocionante... Lembram como a mídia caiu e pau em Marisa Letícia, a mulher de Lula, quando ela tirou passaporte italiano? Foi tratada como uma criminosa...
– Ah, lembro-me que a cientista política Lúcia Hipólito deu uma declaração daquelas de não deixar nenhuma louça inteira à rádio CBN...
– Como assim, senhora minha sogra?
Dona Lô fez de conta que não ouviu. Sequer disfarçou. Deu o calado por resposta e, dirigindo-se a Ducarmo, “Você viu que Paris pontificou de branco e bege na Semana da Moda? Gisele deu um pulinho por lá; desfilou para a Givenchy” Todavia Ducarmo, que estava com uma cara que era puro espanto, ficou caladinha... No meio daquele fogo cruzado, Estela assumiu a palavra: “Lúcia Hipólito disse mais ou menos que ‘A mulher do presidente Lula, seus filhos e netos são hoje também cidadãos italianos. O que será que isto quer dizer? Como é que esta atitude será interpretada pela maioria dos brasileiros, que não querem fugir do país e que tentam, todo santo dia, fazer do Brasil um país melhor? Como o Brasil espera inspirar confiança nos investidores estrangeiros quando a família do presidente da República já conseguiu para si mesma uma rota de fuga do país?’” (Rádio CBN, 25/12/2005).
– Nooooooooooossa que mulherzinha de cabeça privilegiada é a minha Estela!
– Claro, né Pedro! Estela não é apenas a sua memória, mas seu tudo!
– Mas voltando à Dilma em suas raízes búlgaras, fiquei muito tocada com ela ao lado do túmulo do irmão que nunca viu...
Dilma Rousseff durante visita ao túmulo do irmão Luben Roussev, em Sófia; após visita, ela foi para Gabrovo, terra natal do pai (Foto: Roberto Stuckert Filho / Presidência)
– Estela, lembra-se da historia mais pitoresca do centenário do bisavô Chico Tropeiro?
Espantada Ducarmo indagou: “Ele viveu cem anos?”
– Não, Ducarmo! Uma pena! Foi o seguinte: mamãe decidiu comemorar o centenário dele. A bisavó Constância ainda era viva, estava com noventa e lá vai cacetada, acho que 93, bem velhinha, bem quietinha, não dava o menor trabalho a ninguém, vivia quase invisível, só rezando em seu rosário de Lágrima de Nossa Senhora. A vovó ainda era bem mandona, mas dividia o poder da Família Tropeiro com mamãe, sem problemas, na maior delicadeza do mundo, pois ali era a finura em pessoa...
– ...
– Mas quem cuidava da bisavó era mamãe, portanto ela era a pessoa que mais sabia da historia da família e teve o cuidado de registrar tudo o que ouviu num caderno, onde há relatos desde a ida das famílias de minha bisavó Constância, do Ceará, e de meu bisavô Chico, do Maranhão, para São Paulo, tal como na música de Gonzagão, "A triste partida", poema de Patativa do Assaré, “Nóis vamo a São Paulo/Viver ou morrer”... E o caminho de volta feito por Chico, que ainda não era Tropeiro, e sua mulher, já com a decisão de ser tropeiro. No bolso, um dinheirinho suficiente para começar a tropa de burros... Chico, que virou tropeiro, de fato e de nome registrado em cartório, diferentemente da música de Gonzagão não teve destino mesquinho...
“Nóis vamo a São Paulo/Que a coisa tá feia/Por terras alheia/Nós vamos vagar/Meu Deus, meu Deus/Se o nosso destino/Não for tão mesquinho/Aí pro mesmo cantinho/Nós torna a voltar...” (Vídeo, aqui)
– ...
– Assim foi que, em meio aos preparativos do centenário, que previa missa na capela e tudo mais, Donana, a minha mãe, pediu à bisavó que preparasse umas palavrinhas para o “discurso de improviso”, que o padre pediria pra ela fazer, na capela...
– ...
– Ao que ela respondeu irada e falando alto, coisa que não era parte de seu modo de ser: “Num vou fazer discurso coisa nenhuma! Vocês querem fazer de Chico uma coisa que ele não era: um santo! Foi um marido bom, um pai sem igual, mas era rabujento demais, desde novo. Trabalhador sem igual, que enriqueceu dando um duro danado e comendo poeira rasgando os sertões com sua topa de burros... Nos primeiros tempos comeu muita rapadura com farinha seca... E enriqueceu também às custas do meu trabalho, de cuidar de tudo quando ele estava rasgando sertão, mas muita gente esquece que homem casado não fica rico sozinho, só com o seu suor. Posso dizer que fiz essas fazendas quase sozinha. Muitas vezes ele passava quase seis meses fora de casa...
– ...
E complementou: “Mas homem abusado era aquele ali! Como não pode contar direitim quem ele era, prefiro calar. Taí uma louça que nunca vou quebrar! Não vou querer que meu neto, Dotozim Felipe Tropeiro, e minha bisneta Lô, tenham outra imagem dele, já que foram enganados a vida toda, mas Neneco Tropeiro, meu filho, tá aí de prova, mas de certeza também não vai gostar que eu fale. Só sabem dizer que Chico deixou muito recurso pra nós! Cofos e cofos de dinheiro, muita terra, muito gado... Esquecem do tanto que trabalhei, que sofri dentro desses matos selvagens cuidando de tudo. Enfim, ainda que não tivesse deixado nada, além da vida, é o tronco velho da Família Tropeiro, temos de respeitar!”
Estela, incontinenti, disse que Dilma falou praticamente o mesmo em Gabrovo, quando um jornalista búlgaro indagou o que ela devia a Petar Steganov Rousev (Pedro Rousseff), ela respondeu prontamente: “A meu pai? A vida! Tem algo mais do que isso?”.
Fazenda Matinha de Dona Lô, 10 de outubro de 2011
06:48
Nota da presidenta Dilma Rousseff às ganhadoras do Prêmio Nobel da Paz
A presidenta Dilma Rousseff divulgou hoje (8/10) nota oficial com cumprimento às ganhadoras do Prêmio Nobel da Paz – a presidenta da República da Libéria, Ellen Johnson Sirleaf, a ativista liberiana Leymag Roberta Gbowee e a jornalista iemenita Tawakkul Karman. Dilma Rousseff destacou a atuação delas na promoção da paz, democracia, liberdade e igualdade de gênero.Confira abaixo a íntegra da nota:
Recebi, com grande satisfação, a notícia da outorga do Prêmio Nobel da Paz deste ano para a presidenta da República da Libéria, Ellen Johnson Sirleaf, para a ativista liberiana Leymag Roberta Gbowee e para a jornalista iemenita Tawakkul Karman.
Primeira mulher eleita presidenta em um país africano, Ellen Johnson Sirleaf tem contribuído, ao longo de toda sua vida pública, para a paz e o desenvolvimento da Libéria.
Sua compatriota, Leymah Roberta Gbowee, mobilizou mulheres de todas as etnias e religiões para enfrentar o regime de Charles Taylor, na Libéria, e contribuir para o fim da guerra civil em seu país.
Tawakkul Karman, por sua vez, tem trabalhado pela promoção da paz e da democracia e pelos direitos das mulheres no Iêmen antes e durante a “Primavera Árabe”. Fundou, em 2005, a ONG “Women Journalists Without Chains”, grupo que tem tido atuação destacada na promoção da liberdade de imprensa naquele país.
Dilma Rousseff
Presidenta da República Federativa do Brasil
Dona Lô sempre a cuidar de retirar minhocas de meu juízo
ResponderExcluirFátima, Dona Lô veio com tudo e ela é genial. Muito bom o jeitão dela de ver e explicar as coisas
ResponderExcluirFiquei encantada com a riqueza do textos, além das ilustrações adequadas
ResponderExcluirFátima de Deus que texto...parabéns, fiquei mais sabida com tanta informação. E Dona Lô...vixe, matei a saudade, eita mulher que gosto e admiro.
ResponderExcluirUm cheiro grande.
Dona Lô matou a pau. Não sobreou pra ninguém. Vamos ver se Pedro toma jeito. Ali é herdeirinho que se acha! E o bicho ainda é PMDB doente, viiiiiiiiiiiiiiiixe
ResponderExcluirGente, Dona Lô é só encantaria. Juro
ResponderExcluirViiiiiiixe que Dona Lô no fim de semana não deixou pedra sobre pedra. Deu o tom
ResponderExcluirDona Lô, vc arrasou mulher. Em tudo, até na carne de lata com mel e pimenta malagueta
ResponderExcluirAchei Dona Lô uma simpatia
ResponderExcluirFátima, a Dona Lô sozinha é um espetáculo!
ResponderExcluirAchei um conto estimulante e bonito. Dona Lô é figurança
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