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sábado, 1 de janeiro de 2011

Comemorando a posse da presidenta Dilma na Chapada do Arapari



Fátima Oliveira

Quando saiu o ônibus com a Comitiva das Mulheres da Chapada do Arapari rumo à Brasília para prestigiar a posse de Dilma, que aqui já é íntima de todo mundo, pois só é chamada de a presidenta ou de a Dilma, tamanha já é a intimidade, parece que uma nuvem densa de tristeza cobriu o povoado
Dois depois da algazarra dos votos de boa viagem e da choradeira de crianças e das mil e uma recomendações da parte das mulheres para os maridos e vice-versa e da gritaria de “Vão com Deus!”, o silêncio se abateu sobre as pessoas, que não eram poucas, que foram apreciar a partida do ônibus. Tantas que a calçada da casa de Dona Lô estava “coalhadinha” de gente. Todas acenando com a mão até o ônibus sumir na estrada, quando começaram a se despedir...



“Ei cumpadi Neco, vai ficar solto na buraqueira, hein mestre?” Falou rindo Seu Zé Preto do reisado. “’Marrapá’, deixe de cunverseiro besta que num é eu que tô de rabicho cum quenga do cabaré de Lalá, o Peixeira no Bucho”, respondeu Neco, marido de Zuleide, que era uma das mais animadas ao se despedir do marido dando gaitada e dizendo: “Olhe, não deixe meus fiim passar fome, não! Faça o ‘dicumé’ na hora certa, todo santo dia, e não deixe o arroz queimar, viu Neco? Vou lhe trazer um agradinho lá da Brasília”.
A zuação era a tônica ali. Chico Grosso, não deixou por menos:
– Vumbora minha gente, acabou-se o furdunço! As malucas caíram nas abas do mundo junto com Dona Lô, que nasceu batendo perna, por isso “veve” de inventar moda “prumode” só “disassossegar” todo mundo, “iscritim” a mãe dela, a finada Donana. Ô raça de mulher mandona, meu Deus do céu!
Ao que Zé Baixinho, que desde o dia em que Dilma se elegeu e ouviu pela primeira vez Dona Lô tocar no assunto da viagem pra posse “da mulher”, não se agradou nem um tico da historia, naquela hora não se conteve e tascou com veemência:
– Espia bem se era preciso essa mulherzada se tocar daqui pra Brasília, lá no fim do mundo, um dia e uma noite de “viage”, só “prumode” vê Lula botar uma faixa no pescoço da Dilma! Um dia e uma noite de viagem só pra isso? Só sendo “mermo” arranco de dinheiro de Dona Lô, que ela tem muito, cofos e cofos de dinheiro ajuntado “derde” o avô dela, aí fica “percurando” com que gastar. Ô magote de besta! Com esse corrós que elas vão gastar, eu juro que eu fazia um pé de meia, comprava umas “novias” bem aprumadas e famosas e dentro de uns cinco anos eu tava era rico! Quer apostar quanto?
Caminhão na Belém-Brasília
– Tá chamando as “muíe” de égua, hein Zé Baixinho?
– Queeeeeeeeem? Eu? “Cunversa” Mundico, Deus me livre e guarde! “Increduincruz”, Ave-Maria! Posso inté achar, mas dizer Deus me livre! Chamei de besta, que aqui num é que nem égua, é que nem bobo, de bobice... Depois que Dona Lô veio morar pra cá elas engrossaram o cangote. Ficaram “iscritim” umas cobras jararacas. Dona Lô dá coito a elas. Tudinho, tudinho... O cabra aqui tem de ser esperto, andar na linha, ou cai fora. Dona Lô vira a muzenga quando zangada. Num viu que expulsou até o padre da casa dela?
Pedro, que a tudo presenciavam com ar de riso, resolveu dar um pitaco: “Ô gente, eu e a Estela vamos ficar por aqui até a mulherada voltar de Brasília. Qualquer coisa que alguém precisar, estamos aqui às ordens. Mas é qualquer coisa, mesmo. Não se acanhem. Sei que muitos de vocês ou são do Reisado de Seu Zé Preto ou acompanham o reisado toda noite. Sendo assim, mesmo com a ocupação de olhar a meninada, quem ainda tem menino pequeno, vai ter tempo de se divertir também. Dona Lô viajou, mas deu ordem a Luís Vaqueiro que escolhesse comigo uma cria bem boa pra gente fazer uma carne na brasa no dia 1º. de janeiro, mas sem bebida pelo meio.
– Eu num disse?! Eu num disse?! Conheço aquela Dona Lô ali, desde bem “piquininha”, empurrei muito a bicicletinha dela pra “riba” e pra baixo nessas ruas “bebhi”, “tudinha”. Aquilo só sabe mandar!
– ...
– Foi criada que nem u’a princesa e agora manda qui nem u’a rainha. Tombém, só muntada na bufunfa que os povo dela juntou, que ficou tudinho pra ela, sô: o bisavô, o velho Chico Tropeiro; o avô, Neneco Tropeiro; e o pai, o dotozim Felipe Tropeiro. Essa ruma de home trabaiou a morrer pra deixar tudinho pra ela! Inté a propriedade chama “Matinha de Dona Lô”! Nome dado pelo dotozim Felipe Tropeiro que derde ela “pixixitinha” inventou essa histora de chamar e botar todo mundo pra chamar ela de Dona Lô! Pois num é que pegou? Pense numa rainha, é ela! “Manda quem pode e obedece quem tem juízo”, né não?
E a turba ria à bandeiras despregadas. E ele acunhou: “Apois muito que bem: ‘Inda’ inventa de viajá carregano nossas muié, deixando nós aqui tudinho sendeiro, sem muié, “prumode” ralar os pé de noite ‘dibaixo’ dos ‘lençós’, e ainda deixa ‘ordi que a gente num pode beber! “Quiquêisso’, sô! O tempo do cativeiro ‘jacabou’ e faz é muito tempo! Tem mais, não! Nessa Dilma eu num voto mais. Ora sim senhor, se ela ganhá ‘traveis’ outra ‘inleição’ essa Dona Lô cai de novo doida na buraqueira carregando nossa muié pre’ssa Brasília, pode ficar sabendo logo”.



“Calma Zé Baixinho, queria era ver você dizer isso na cara de Dona Lô,” argumentou Pedro. “Miou dr. Pedro! E Vosmicê acha qui eu cumi manga cum febre? É ruim, hein?” Provocou gargalhada geral.
– Pois bem, no dia 1º. de janeiro a partir do meio-dia, todo mundo do povoado, mas todo mundo mesmo, está convidado prum churrasco ali debaixo do pé de manga, não é Estela? É aqui que vamos ver Dilma tomando posse. Vou montar um telão.
– Claro, claro! Zé Baixinho, a Dindinha não disse que não se poderia beber. Ela apenas falou que só daria o garrote pro churrasco, meu amigo! Beber pra se divertir, até eu vou beber. Afinal quero comemorar também bebendo “umazinha”.


– ...
– Mas cada pessoa que quiser beber que traga a sua, está bem? É também uma maneira de se beber menos, pois quando a bebida é dada de graça e à folote, as pessoas exageram. E nada de exagerar, pois aqui vocês todos estão com a responsabilidade de cuidar de crianças, de pessoas idosas, de aguar canteiro e de dar comida a porcos e a galinhas. Ou não é, minha gente?
– ...
– Lembram que Dindinha lhes passou a régua dizendo: “Olhem, olhem, nossa viagem é de poucos dias. Vocês vão cuidar dos bacurizinhos de vocês, dos velhos e das coisas viventes da casa por poucos dias. Se cuidarem bem, num morre nada e nem ninguém. Ou não são macho, maxixe e maduros pra dar conta disso que mulher cuida todo santo dia de olhos fechados?”
Neco quase não conseguia falar, do tanto que ria: “Apoiado dra. Estela! Num se aperrei com Zé Baixinho, não senhora! Ele tá assim ‘pucardiquê’ nunca ficou um dia longe da ‘cheirim’ dele, então tá é de cachimbo inchado. Só isso e mais nada! Fique fria e do que precisar de nós pra ajudar nas coisas da festa da posse de Dilma, é só chamar. Pois boa-noite, que tô indo pros meus ‘quifazeres’.”
Depois dessa conversa no dia em que as mulheres viajaram, Estela, Pedro, Luís Vaqueiro e Cesinha ficaram cuidando dos preparativos do churrasco, assim como pensando numa comida bem boa pra receber as mulheres quando chegassem da viagem.
Dona Lô telefonou a primeira vez na hora em que estavam tomando o café da manhã em Porangatu (GO). Disse que a viagem estava sendo ótima e que dois carros de imprensa estavam seguindo o ônibus; e onde ele parava havia gente filmando e fotografando as mulheres e pedindo entrevistas; e que mãe Zefinha era a que mais estava animada com aquela muvuca toda. E já havia dado duas entrevistas!
Ela também telefonou na hora do piquenique, dizendo que pararam num acostamento bem sombreado, local de pouso de caminhonheiro e que foi algo dos mais bonitos e que até compartilharam a comida com os repórteres e cinegrafistas que estavam nos dois carros que as acompanharam.



Pelo relato, foi bonito. Até as faixas e os pirulitos que levavam saudando Dilma foram expostos na beira da estrada; e os carros que passavam buzinavam, alguns até pararam para fotografá-las.
“Enfim, viagem tranquila e sem contratempo de qualquer ordem, a não ser quando chegamos à pousada me Brasília, podres de cansadas, havia um batalhão de repórteres na porta! Viramos celebridades, viu Estela? Olhe o respeito daqui por diante!”
O churrasco transcorria muito animado; Seu Lazinho das Emboladas trouxe a sua viola e dedilhava cada música dessas bem antigas que dava gosto – e foi a sensação da churrascada.



Todo mundo assistindo no telão a tudo da posse de Dilma de olhos grudados, prestando atenção à procura, no meio daquela multidão, de algum sinal das “mulheres da Chapada”, quando, num programa de TV, que transmitia ao vivo as preliminares da posse, quem não estava prestando atenção, reconheceu a voz:
“Meu fii, nós viajemos, eu e minhas cumpanheira, que soma 45, só muié, vindo dum lugar que dicerto Vosmicê nunca ouviu falar, a Chapada do Arapari, lá das brenhas do Maranhão, lá donde Lula levou o Luz pra Todos, assim como um sonho que nunca nem pensamo, só Lula mermo, minha gente, sabe? Viajemos, como eu ia dizendo, quaje 24 horas de lá até cá, prumode dizer a Dilma que tamo com ela! Pro que der e vier. Em Dilma ninguém trisca nem com um cisco, pode ter certeza! Dilma vai guvernar sem disavento argum, pode anotar no papeli! Eu assino meu nome nele. Sei assinar meu nome, viu minha gente? Nós confiemo nela. Lula dixe que era ela, intonce votemo nela. Cum uma muié que chega na altura em que botemo a Dilma, já posso morrê, que a muié agora sim tem valor, né não, meu fii? Nunca na vida pensei em alcançar isso, né não, Lô?”

Rolls royce presidencial
Então, apareceu Dona Lô ao lado de Mãe Zefinha... Foi uma gritaria. As crianças pareciam estátuas pregadas no chão, nem se mexeram, só apontavam pro telão! Foi um silêncio emocionado e emocionante, no qual só se via alguns homens puxando o lenço, enxugando as lágrimas...

Chapada do Arapari, 1º. de janeiro de 2011

9 comentários:

  1. Aêêê Dona Lô, boa festa aí em Brasília, apesar da chuva. Dilma merece

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  2. Dona Lô, daqui de casa, deitada em minha cama ouço o discurso, o primeiro da nossa presidenta Dilma no Congresso Nacional. Estou emocionada

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  3. Fátima Oliveira, sua criatividade com Dona Lô, arrasou. Os episódios são muito gostosos. Estou também muito feliz com nossa presidenta Dilma

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  4. Luís Alberto Furtado2 de janeiro de 2011 às 08:27

    Como não fui à Brasília assistir à posse de Dilma e ver Lula se despedindo do povo, me senti nas comemorações da Chapada do Arapari

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  5. Muito bem narrado. Tenho adorado Dona Lô e sua turma

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  6. Deputadas comemoram ministério recorde de mulheres
    Ao assumir o cargo de primeira Presidente mulher do Brasil, Dilma Roussef conseguiu outro feito inédito. Apesar de não conseguir atingir sua meta de montar um ministério com 30% de mulheres, sua equipe possui o maior número de mulheres da história do Brasil e três vezes mais do que a equipe do ex-presidente Lula. Dos 37 ministros, nove são mulheres.

    Desde o começo das reuniões da transição, Dilma pressionou os partidos a priorizarem mulheres em suas listas de “sugestões”. “Ela forçou muito a barra para que o partido indicasse uma mulher para o Ministério do Esporte. Discutimos muito isso, pois temos quadros como a Manuela D´Ávila e a Luciana Santos. Mas indicamos o Orlando Silva porque ele está muito familiarizado com as questões da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos”, diz a senadora eleita Vanessa Graziotin, líder do PCdoB na Câmara.

    Ela afirma, ainda, que Dilma pressionou os comunistas justamente graças ao esforço do partido para promover mulheres. “Nossa bancada é a mais feminina da Câmara: 40% de mulheres. “Eu sou a única líder de bancada, por exemplo”.

    Militante feminista histórica, a deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP), celebra como um avanço histórico as mulheres escolhidas por Dilma para a Esplanada dos Ministérios, mas pondera. “Em 185 anos de poder Legislativo, nunca uma mulher ocupou cargo na mesa diretora da Câmara dos Deputados. A cultura política no Brasil ainda é patriarcal e machista”.

    A deputada, que é uma estudiosa da presença feminina no poder, apresenta números que impressionam. “Enquanto no parlamento da Argentina 40% das cadeiras são ocupadas por mulheres, no Brasil elas representam apenas 9%”. Ela elaborou uma Projeto de Emenda Constitucional (PEC) que obriga os cargos da mesa diretora da Câmara a terem pelo menos uma mulher. Erundina também defende que os partidos tenham uma cota mínima de mulheres em sua direção.

    Na gestão da primeira mulher a presidir o Brasil, coube à cota feminina, além do Planejamento, o Meio Ambiente, Desenvolvimento Social, Cultura e Comunicação Social, e pastas com menor visibilidade como Pesca, Direitos Humanos, Igualdade Racial e a Políticas de Gênero.

    Fonte: Brasil Econômico

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  7. Dona Lô quanto sucesso, as mulheres da Chapada de Arapari viraram notícia na posse de Dilma.

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  8. Achei sensacional. A autora é muito criativa

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  9. Yolanda Ferreira Muniz7 de fevereiro de 2011 às 20:48

    Fátima, emocionante. Que doçura

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