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terça-feira, 25 de abril de 2017

Sobre o desejo de ter filhos em tempos de bebês de proveta

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Fátima Oliveira
Médica – fatima.oliveira1953@gmail.com @oliveirafatima


Em minha opinião, elaborada durante mais de duas décadas acompanhando as Novas Tecnologias Reprodutivas conceptivas (NTRc), sobre as quais escrevi vários artigos e um livro, “O Estado da Arte da Reprodução Humana Assistida em 2002 e Clonagem e Manipulação Genética Humana: Mitos, Realidade, Perspectivas e Delírios” (CNDM/MJ, 2002), e refletindo sobre ela, afirmo que o desejo de ter uma prole é tão forte quanto o de não tê-la.
Hoje, quando filhos demoram a chegar, começa a peregrinação aos consultórios de ginecologia. Diagnosticada a causa da infertilidade, da mulher e/ou do homem, e diante da impossibilidade de ter um “bebê feito em casa”, está no horizonte o “bebê de proveta”, que não trata a infertilidade, é apenas um meio de tentar ter um bebê.


Resultado de imagem para bebes de proveta Em “Filhos(as) da Tecnologia: questões éticas envolvidas na procriação assistida” (1997), considerei que “infertilidade em geral não é o mesmo que uma ‘doença’ física, é muito mais uma condição social do que biológica. A maior parte dos casos de infertilidade é curada ‘com o tempo’, e a maior façanha conseguida, até agora, no mundo, é que nascem mais crianças na ‘lista de espera’ dos ditos ‘tratamentos’ do que dos ‘tratamentos’, já que o sucesso deles não alcança 15%. Sem nos esquecermos de que as fraudes e os erros nos diagnósticos de infertilidade são numerosos”.
Não é um passeio levar um “bebê de proveta” para casa. É inseguro e caríssimo, bem distante das possibilidades de quem não tem muito dinheiro. Os serviços públicos de reprodução assistida em universidades públicas são raros no Brasil, e os existentes estão sucateados. E os “planos de saúde” não cobrem os custos exorbitantes dos serviços privados das NTRc!


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       O assunto veio à baila porque fui procurada por uma família conterrânea para conversar sobre o tema. Como disse a potencial avó: “Lemos seus artigos na internet depois do ‘leite derramado’ e de uma família destroçada. Encontramos também o seu e-mail”. Resumindo: o casal vendeu tudo o que possuía (casa boa e carros) e foi tentar um “bebê de proveta” em São Paulo. Lá ficou três anos e voltou sem bebê, e a mulher com um quadro psiquiátrico grave.


Louise Brown a Primeira bebê de Proveta da Humanidade
Louise Brown, o primeiro bebê de proveta da humanidade (25 de julho de 1978, no Hospital Geral de Oldham, perto de Manchester, Inglaterra)
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    Em “As Novas TecnologiasReprodutivas conceptivas a serviço da materialização de desejos sexistas,racistas e eugênicos?” (2001), digo: “O legítimo desejo pela maternidade e pela paternidade não pode materializar-se à custa de procedimentos inseguros e de supostos tratamentos que causam sofrimentos físicos e mentais, nem à obsessão e à obstinação pelo(a) filho(a). Cabe ao Estado a elaboração de meios de controle e contenção da aplicação de técnicas experimentais como tratamentos ‘testados e aprovados’ e das práticas dos technic-doctors”.
Sob a égide dos direitos humanos, não é ético que, para “fazer o bem”, a ciência utilize caminhos inseguros e que levem, deliberadamente, à iatrogenia. Em “Não se fazem mais bebês de proveta como antigamente: a obsoletização da Fertilização in vitro e transferência de Embriões” (1998) afirmei que “a defesa democrática dos direitos reprodutivos inclui o acesso ao tratamento da infertilidade – nos casos em que ela é de fato uma doença – e a segurança dessas terapias”.


Resultado de imagem para gena corea the mother machine Relembrando a medicalização em si como uma ferramenta excepcional de poder político, não é de nossa competência ética “julgar” quem deseja ter ou não uma prole, mas em respeito à liberdade reprodutiva, e para assegurá-la, temos o dever de apoiar as decisões referentes a procriar ou não e que elas sejam concretizadas em segurança e sem danos à sanidade física e mental.


Resultado de imagem para livro “O Estado da Arte da Reprodução Humana Assistida em 2002" PUBLICADO EM 25.04.17
Resultado de imagem para bebes de proveta  FONTE:  OTEMPO     

terça-feira, 18 de abril de 2017

Haverá dia seguinte após a abolição da Lei Áurea?

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Fátima Oliveira
Médica – fatima.oliveira1953@gmail.com @oliveirafatima
           

            Na toada em que o Brasil vai, não é de se duvidar que o que parecia humor político de crítica ao desmonte dos direitos que conferem cidadania a seu povo, poderá concretizar-se. Circulou no Twitter que o atual governo cogitava abolir a Lei Áurea! Era um humor-terror tão surreal que parecia engraçado pelo absurdo que representa, a um ponto que perde para o inferno de Dante Alighieri, na “Divina Comédia”!


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Relembro o teor da Lei Áurea:
“Lei 3.353, de 13 de maio de 1888, Declara extincta a escravidão no Brazil.
A Princeza Imperial Regente, em Nome de Sua Magestade o Imperador o Senhor D. Pedro II, Faz saber a todos os subditos do Imperio que a Assembléa Geral decretou e Ella sanccionou a Lei seguinte:
Art. 1º: É declarada extincta, desde a data desta Lei, a escravidão no Brazil.
Art. 2º: Revogam-se as disposições em contrario”.


Resultado de imagem para camélias do leblon 13 de maio de 2017 – hoje, além do Dia da Abolição da Escravatura, por ter oficializado o fim do cativeiro negro, também é Dia Nacional de Denúncia contra o Racismo –, a Lei Áurea completará 129 anos. Em 1888, 16 anos após o último Censo do Império (1872), beneficiou 750 mil do total de 1,5 milhão de escravos, pois metade dos escravos eram “forros” por seus próprios meios.


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Resultado de imagem para lei aurea  (Assinatura da Lei Áurea no Paço Imperial)


Eis o contexto da oficialidade do fim da escravidão negra: “Exatos 90 dias separam a Lei Áurea do fim do Império e do advento da República, tão insana para negros quanto o Brasil Colônia, que instaurou a escravidão, e o Império e suas leis que impediam o acesso dos escravos à escola: decreto complementar à Constituição de 1824; e à terra: Lei da Terra, de 1850, cuja posse, para negros, só era permitida via compra!” (“Os diasseguintes à Abolição da Escravatura”, O TEMPO, 2008).


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Imagem relacionada   (Fátima Oliveira e Sueli Carneiro)


Resultado de imagem para lei aurea  Sueli Carneiro, em “A carta da Princesa” (2008), relembra que “três meses após a data dessa carta, a princesa e o imperador foram depostos e desconhece-se o destino dos tais fundos. É o Brasil desde sempre”. Acrescenta o conteúdo da carta da princesa Isabel, de 11 de agosto de 1889, para o visconde de Santa Victória, que doou mais de 2/3 da venda de seus bens ao Império “para prover condições dignas de sobrevivência e inserção da população ex-escrava na sociedade brasileira: ‘Com os fundos doados pelo Senhor, teremos oportunidade de colocar estes ex-escravos, agora livres, em terras suas próprias trabalhando na agricultura e na pecuária e delas tirando seus próprios proventos’”.
Percebe-se hoje que a mentalidade escravocrata é arraigada nos meios políticos e se expressa bem no atual parlamento nacional, que conta com número expressivo de descendentes de senhores de escravos. Vide a aprovação da terceirização geral e irrestrita sob a chancela da Presidência da República e do patronato escravagista para postergar a aposentadoria até a morte, tal como consta no que estão chamando “reforma da Previdência”, que evidencia um retorno ao trabalho vitalício e escravo, um roubo de futuro do nosso povo. As senzalas do patronato desejam mais: o fim da Lei Áurea!


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Resultado de imagem para castro alves Afrodescendentes constituem mais da metade do povo brasileiro; assim, como seremos expectadores passivos da abolição da Lei Áurea? Lutaremos na companhia de Castro Alves: “Fatalidade atroz que a mente esmaga!/ Extingue nesta hora o brigue imundo/ O trilho que Colombo abriu nas vagas,/ Como um íris no pélago profundo! / Mas é infâmia demais! ... Da etérea plaga/ Levantai-vos, heróis do Novo Mundo! / Andrada! arranca esse pendão dos ares! / Colombo! fecha a porta dos teus mares!” (“O Navio Negreiro”, Castro Alves, 1869).
Quem sobreviver verá.


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Resultado de imagem para lei aurea PUBLICADO EM 18.04.17
Resultado de imagem para lei aurea  FONTE:  O TEMPO

terça-feira, 11 de abril de 2017

É uma luta necessária banir o fascismo da sociedade brasileira

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Fátima Oliveira
Médica – fatima.oliveira1953@gmail.com @oliveirafatima


Registro o meu repúdio ao ocorrido no Clube Hebraica do Rio de Janeiro, em 3 de abril passado, quando, a convite do presidente Luiz Mairovitch, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) proferiu uma palestra, após cancelamento de outra na sede paulista da Hebraica por solicitação de um abaixo-assinado com mais de 2.600 assinaturas da comunidade judaica.


Resultado de imagem para frases sobre o fascismo Jair Bolsonaro é misógino, homofóbico, racista e fascista confesso; não é polêmico, como alguns dizem por aí, é indubitavelmente um fascista! Ou alguém imaginava que ele faria uma declaração de amor ao povo brasileiro? Sem novidades, pois o fascismo é, de cabo a rabo, perseguição à democracia, desde o nascedouro.


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Resultado de imagem para foto do Clube Hebraica da cidade do Rio de Janeiro    A comunidade judaica no mundo, incluindo o Brasil, não é um bloco monolítico! Basta avaliar que a Hebraica de São Paulo cancelou a palestra do referido deputado, mas a do Rio de Janeiro não atendeu os apelos de cancelamento!


Uma carta de resposta dos judeus que não riram

        
         Enquanto a palestra ia de vento em popa, arrancando risos de cerca de 300 convidados, outros 150 judeus protestavam do lado de fora da Hebraica e relembravam os judeus mortos pela ditadura militar de 1964: o jornalista Vladimir Herzog (1937-1975) e a psicóloga Iara Iavelberg (1944-1971).


Jornalista Vladimir Herzog (1937-1975)
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Resultado de imagem para vladimir herzog foto da morte

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Resultado de imagem para Iara Iavelberg


Dentre os inúmeros impropérios ditos pelo deputado, eis alguns paradigmáticos do ideário fascista pelo qual se norteia: “O deputado afirmou que as reservas indígenas e quilombolas atrapalham a economia: ‘Onde tem uma terra indígena, tem uma riqueza embaixo dela. Temos que mudar isso aí’. Ele disse que foi ‘a um quilombo’. De lá, voltou com a seguinte percepção: ‘O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano são gastos com eles’.
Segundo Marcelo Braga Edmundo, em “Bolsonaro: ‘Nem um centímetro para quilombola ou reserva indígena’”, o presidenciável não poupou os refugiados. “Não podemos abrir as portas para todo mundo”, disse. Ele não se mostrou, porém, avesso a todos os estrangeiros: “Alguém já viu algum japonês pedindo esmola? É uma raça que tem vergonha na cara!”.


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Resultado de imagem para Benedita da Silva contra Jair Bolsonaro A deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) encabeçou um grupo de parlamentares que protocolou, em 6 de abril, uma ação na Procuradoria Geral da República (PGR) contra Jair Bolsonaro pelo crime de racismo. É esperar no que vai dar! Há repúdios significativos do movimento negro e de setores da comunidade judaica.


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Resultado de imagem para Protesto em frente ao Clube A Hebraica, do Rio de Janeiro


        O cientista social, mestre em letras pelo programa de Estudos Judaicos e Árabes da USP, Daniel Douek, em “Uma carta de resposta dos judeus que não riram” (7.4.2017), declarou: “Aqui entre nós, talvez seja o caso de dizer o óbvio: campo de concentração não é escola de direitos humanos. Ao contrário, desumaniza; corrói corações, mentes e almas; dilacera a fé nos homens e na própria possibilidade de humanidade; deixa marcas indeléveis, que perduram mesmo entre gerações que não vivenciaram o extermínio; não é atalho para a vida digna, mas um obstáculo a ser transposto. Há alguns anos, ao discutir a afirmação deplorável de que os judeus não aprenderam nada com o holocausto, o pedagogo Gabriel Douek foi certeiro: ‘O que está por trás desse tipo de afirmação é a crença de que o assassinato de 6 milhões de judeus durante a Segunda Guerra Mundial ocorreu para ensinar algo a esse povo’. Assim, dizer que os judeus deveriam ter aprendido algo, e não aprenderam, é conceber o genocídio judaico como uma espécie de ‘lição’ ou ‘castigo’ que não surtiu efeito. E ainda mais: é afirmar que o holocausto não foi suficiente”.
Urge banir o fascismo da sociedade brasileira.


Resultado de imagem para Benedita da Silva contra Jair Bolsonaro PUBLICADO EM 11.04.17
 FONTE: OTEMPO

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