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Fátima Oliveira
Médica - fatimaoliveira@ig.com.br
As guerras religiosas expressam como os humanos podem ser irracionais. E a intolerância religiosa, conceitualmente uma modalidade de guerra religiosa, é um veneno social incompatível com as liberdades democráticas.
Em 24.8.2010 escrevi "Um lembrete: no Brasil, nenhuma religião se encontra acima da lei", sobre a imposição da morte social a ex-fiéis da denominação religiosa Testemunhas de Jeová, através da desassociação (expulsão); e da dissociação (abandono e/ou troca de religião) - que culminam na morte social, um misto de desprezo e nojo; uma espécie de gelo que, na prática, diz: "Você não é nada!". Estamos diante de um crime. Filosofo: onde está Deus que permite crimes em seu nome?
A morte social se concretiza na interdição do convívio com pessoas amadas, da igreja e da família - se professam a mesma fé -, visando a destruir a honra e imagem da pessoa, e se configura como assassinato de reputação - violência incomensurável de decorrências emocionais incalculáveis, uma punição imoral que fere os direitos humanos fundamentais. E eu pergunto é se é lícito e se é ético uma religião, qualquer uma, em nome de Deus, violar direitos humanos.
E indago também por que e até quando uma República democrática e laica faz de conta que os "freios morais" que integram o escopo doutrinário de algumas religiões, que massacram direitos humanos e geram suplícios, devem ser tolerados como naturais e inerentes às práticas religiosas? Há uma distorção, pois se Deus é pai, não pode ser feitor e nem capitão-do-mato!
É alvissareira a postura adotada, após meticulosa investigação, pela procuradora da República Nilce Cunha Rodrigues, da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão do Ceará, que ajuizou, em 15.7.2011, no Supremo Tribunal Federal (STF), sob a acusação de intolerância religiosa, a ação civil pública contra a Associação Torre de Vigia de Bíblia e Tratados, guarda-chuva oficial das igrejas Testemunhas de Jeová no Brasil, e a Associação Bíblica e Cultural de Fortaleza.
A atitude responde à árdua e corajosa luta iniciada em terras alencarinas, em 2009, de modo solitário, por Sebastião Ramos, persistente e incansável, que pela seriedade ecoou mundo afora e hoje conta com muitos adeptos e simpatizantes.
O Ministério Público, ao aceitar examinar queixas de vítimas de morte social, evidencia que regimes democráticos não podem compactuar com tais descalabros. O pioneirismo da decisão tem o mérito de levar ao banco dos réus as distorções no exercício do sagrado que desrespeitam as leis brasileiras, abrindo caminho para quem se sentir prejudicado, por qualquer religião, seita ou igreja, busque, por meios judiciais, reconhecimento e ressarcimento por danos morais praticados em nome de Deus.
O MP, como guardião da cidadania, ao lançar mão de um instrumento de proteção de interesses sociais, tem em alta conta o sofrimento advindo da morte social, e a vê como inaceitável; e a forma de coibi-la é via ação civil pública, cujo raio de ação é adequado para impedir danos a qualquer interesse difuso ou coletivo. Diz que o Estado foi instado a prover por todos os meios legais a proteção necessária contra preconceitos e discriminações a quem professa uma fé ou não, pois em território brasileiro todas as religiões respondem à Constituição Federal de 1988, que assegura a liberdade religiosa.
Intuo que encontramos o caminho de criminalizar a intolerância religiosa, um ganho imenso para a democracia.
FONTE: O TEMPO, 09.08.2011
Leia também de Fátima Oliveira: Um lembrete: no Brasil, nenhuma religião se encontra acima da lei
Impressiona-me como a religião engana as pessoas e elas levam tempo até acordar. Religião não é Deus!
ResponderExcluirNão gosto de discutir religião. Muitas que se dizem religião não saõ. Para mim Testemunha de Jeová não é religião. E sim uma seita. Fazem uma lavagem cerebral na cabeça das pessoas e quando elas acordam e querem sair há uma outra prisão que é ser ex-TJ. Um absurdo. Sou solidária com tais pessoas porque elas sofrem muito. Nenhuma religião séria provoca infelicidade
ResponderExcluirEu acho qu quem se mete nessas religiões fundamentalistas tem sempre um parafuso desregulado e quando dá conta de querer regular é atingido assim de forma tão covarde. Essa coisa de morte social tem de ser proibida. Concordo com a autora
ResponderExcluirNO CAMINHO COM MAIAKÓVSKI
ResponderExcluirEduardo Alves da Costa
Assim como a criança
humildemente afaga
a imagem do herói,
assim me aproximo de ti, Maiakóvski.
Não importa o que me possa acontecer
por andar ombro a ombro
com um poeta soviético.
Lendo teus versos,
aprendi a ter coragem.
Tu sabes,
conheces melhor do que eu
a velha história.
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na Segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
Nos dias que correm
a ninguém é dado
repousar a cabeça
alheia ao terror.
Os humildes baixam a cerviz;
e nós, que não temos pacto algum
com os senhores do mundo,
por temor nos calamos.
No silêncio de meu quarto
a ousadia me afogueia as faces
e eu fantasio um levante;
mas amanhã,
diante do juiz,
talvez meus lábios
calem a verdade
como um foco de germes
capaz de me destruir.
Olho ao redor
e o que vejo
e acabo por repetir
são mentiras.
Mal sabe a criança dizer mãe
e a propaganda lhe destrói a consciência.
A mim, quase me arrastam
pela gola do paletó
à porta do templo
e me pedem que aguarde
até que a Democracia
se digne a aparecer no balcão.
Mas eu sei,
porque não estou amedrontado
a ponto de cegar, que ela tem uma espada
a lhe espetar as costelas
e o riso que nos mostra
é uma tênue cortina
lançada sobre os arsenais.
Vamos ao campo
e não os vemos ao nosso lado,
no plantio.
Mas ao tempo da colheita
lá estão
e acabam por nos roubar
até o último grão de trigo.
Dizem-nos que de nós emana o poder
mas sempre o temos contra nós.
Dizem-nos que é preciso
defender nossos lares
mas se nos rebelamos contra a opressão
é sobre nós que marcham os soldados.
E por temor eu me calo,
por temor aceito a condição
de falso democrata
e rotulo meus gestos
com a palavra liberdade,
procurando, num sorriso,
esconder minha dor
diante de meus superiores.
Mas dentro de mim,
com a potência de um milhão de vozes,
o coração grita - MENTIRA!
FONTE: www.revista.agulha.nom.br/autoria1.html
Foi resolvida graças à novela das oito uma confusão de 30 anos. Escrito nos anos 60 pelo poeta fluminense Eduardo Alves da Costa, 67, o poema "No Caminho, com Maiakóvski" era (quase) sempre creditado ao russo Vladimir Maiakóvski (1893-1930).
Dra. Fátima Oliveira eu sou uma pessoa que respeita muito as religiões e a liberdade de escolher das pessoas, mas também fico indignado com essas humilhações que muitas igrejas impõem para as pessoas. Acho-as indignas do ser humano
ResponderExcluirAnts de mais nada: Parabéns Fátima. Gostaria de sugerir a leitura de "Exílio e morte social em Grande sertão: veredas", de Márcio Freire, cujo resumo é o seguinte:
ResponderExcluir"Este artigo tem por objetivo estudar os exílios vividos por Zé Bebelo em Grande sertão: veredas. A partir dos desterros é analisada a despersonalização que leva o indivíduo à morte social, causando a perda de representação pública junto à esfera política".
Texto Completo: PDF
http://www.essentiaeditora.iff.edu.br/index.php/vertices/article/viewArticle/110
Dra. Fátima Oliveira você foi bem no fundo da questão. Morte social decretada por religiões é o fim da picada.
ResponderExcluirFico a imaginar como é a piração dessa igreja que persegue pessoas de boa-fé. Um absurdo que merece acabar. E é urgente porque são criminosos
ResponderExcluirEu gostaria de ler um depoimento de uma ex-testemunha de Jeová sobre a grande solidariedade que estão recebendo e o que ela tem a dizer sobre quando era TJ como via as demais religiões, pois TJ que se preza é fundamentalista e odeia candomblé e demais religiões afro. E ainda diz que é coisa do diabo. Agora que a vaca foi beber água no brejo, o que acha?
ResponderExcluirDepois de ler seu artigo busquei mais informações. Você está certa. Não dá pra aceitar esse tipo de comportamento ferino e humilhante. Se a pessoa não, que sai ou seja explusa e a questão acaba aí. Mas ficar perseguindo eternamente é que não dá.
ResponderExcluirDra. Fátima Oliveira, parabéns pelo acolhimento que sempre dá em seus artigos a lutas que parecem perdidas
ResponderExcluirAchei a sua defesa exagerada. Não talvez exagerada, mas forte demais. Claramente d eum lado. Sobretudo porque eu acho que os ex-testemunhas dej Jeová tem assim um ar de fora do mundo, de alucinação, tal qual os fiéis da seita. Nada contra. Eu os respeito muito como são, enquanto seguidores de uma fé. Só que tenho, digamos assim, um pé atrás. Mas estou torcendo para que sejam vitoriosos na defesa dos seus direitos humanos elementares.
ResponderExcluirPrimeiramente obrigado pelo artigo e pela sensibilidade expressa nela. Logicamente quem estiver lendo isto entenderá que eu concordo com esta ação. Já fui uma Testemunha de Jeová e mesmo tendo achado apropriado o meu afastamento de lá, não concordei com o subsequente tratamento a que fui submetido. Quem saí de lá por expulsão ou escolha própria é tratado como tendo uma doênça infecciosa. Todos são orientados a não mais falar conosco (parentes até podem falar mas devem ter o menor contato possível)e se desobedecerem poderão também estar sujeitos a expulsão. Esta infração da lei tem que acabar. Talvez isto ocorra desta vez, visto envolver subtração monetária pelo descumprimento dela.
ResponderExcluirFundamentalistas irracionalmente dogmatizadas!
ResponderExcluirParabéns doutora muito bom artigo esse seu! Palavras bem colocadas e que descrevem bem este crime inflado pelos líderes e cumprido pelas Testemunhas de Jeová em geral. A coisa é realmente assim como expresso pela senhora ostracismo social total. Toda testemunha sabe disto, não pode negar este fato, o que só podem fazer agora é inventar meias-verdades para tentar uma defesa, as vezes ridicularmente chegam ao ponto de usarem um tom agressivo e desrespeitoso, comentários e opiniões estas que demonstram a verdadeira natureza delas - fundamentalista irracionalmente dogmatizadas!
Fátima nenhuma religião tem o direito de descriminar ninguém.
ResponderExcluirCheiros minha linda escritora.
E que a luta prossiga agora com sangue novo e mais apoio das auoridades constituídas. Uma absurdo essa morte social. É sim um atentado contra os direitos humanos
ResponderExcluirSempre tive dificuldades em engolir o modo de viver das Testemunhas de Jeová porque há uma forte interferência nas relações humanas de outras pessoas. Morte social é o fimd a picada mesmo. Um abuso.
ResponderExcluirMeus agradecimentos pela leitura e pela conversa. Foi uma boa conversa. Precisamos manter a luta contra a decretação da morte social, pois ela é uma aberração e degrada a nossa cidadania, por ferir nossos direitos humanos.
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